Problema Solucionado
As comunidades da região do baixo Rio Negro desenvolveram todo um saber-fazer sobre uso e manejo dos recursos naturais. Verifica-se uma forte dependência destes recursos para suas atividades cotidianas, tais como agricultura, extrativismo, caça e pesca. Os sistemas agrícolas envolvem um mosaico de espaços cultivados, onde se destacam os quintais, roçados e capoeiras, integrados à floresta. A agricultura praticada na região consiste no sistema de corte e queima, onde a mandioca é a cultura central. Existe um comércio de frutas, peixe, farinha de mandioca e seus subprodutos entre os moradores locais. No entanto, não se consegue vislumbrar melhoria efetiva na renda e na qualidade de vida com essas atividades devido à dificuldade de escoamento da produção e de inserção dos produtos no mercado por meio de canais diretos de comercialização (sem atravessadores) e que atribuam um preço justo. Em contrapartida, nas últimas décadas a exploração madeireira, que consiste na extração de varas roliças, madeira serrada e produção de espetos para churrasco, tornou-se significativa embora seja desenvolvida de forma ilegal e insustentável, sem plano de manejo e sob condições sociais precárias.
Descrição
Em 2006 o IPÊ iniciou um Diagnóstico Rural Participativo (DRP) nas comunidades da região do baixo Rio Negro, que levantou informações sobre a dinâmica demográfica e histórica e as formas locais de uso dos recursos naturais.
Após o diagnóstico, o projeto focou suas ações no fortalecimento dos produtos da sociobiodiversidade com “valor” sociocultural e potencial econômico. A avaliação tanto do DRP quanto das pesquisas iniciais, sinalizaram a importância local da agricultura e do artesanato. Assim, buscando potencializar as cadeias produtivas, o projeto passou a articular capacitações e trocas de experiência, e assessorar os grupos sociais locais em sua organização (associativismo), nas práticas agrícolas (sistemas agroflorestais - SAF) e em tecnologias sustentáveis (agroindustrialização, “boas práticas” e aprimoramento da produção).
A metodologia abordada em todo processo foi participativa, dinâmica e interativa, onde se busca a troca entre os saberes e a valorização do conhecimento, práticas e recursos locais. Os principais grupos produtivos trabalhados foram agricultores, grupos de mulheres, jovens e artesãos.
Para capacitar agricultores e agricultoras em SAF, foram realizadas oficinas na região. Utilizou-se a metodologia de educação agroflorestal desenvolvida pelo Arboreto/Parque Zoobotanico/Universidade Federal do Acre – UFAC. Esta metodologia sociointeracionista, inspirada em Paulo Freire, utiliza ferramentas lúdicas e interativas. Abordam-se os princípios que norteiam os SAF, inspirados na floresta, como ciclagem de nutrientes, conservação da água e solo, biodiversidade e sucessão natural, de forma prática e dinâmica. O objetivo é estimular a observação da dinâmica florestal e aproveitar o que pode ser replicado nos espaços produtivos. Ao final das oficinas é implantada uma área de SAF, onde espécies de diferentes ciclos de vida e que ocupam diferentes alturas são plantadas juntas em grande quantidade. Há um planejamento prévio conjunto entre os participantes, onde são considerados e discutidos de forma participativa: local de implantação, sementes e mudas disponíveis e necessárias, e é construído um calendário agrícola das espécies anuais e perenes locais e um croqui para visualização da disposição na área.
Nos últimos anos, o IPÊ organizou oficinas e encontros de formação e troca de experiência em SAF envolvendo comunidades da região. As oficinas abriram um diálogo com as comunidades sobre a diminuição do uso do fogo nos roçados, aproveitamento da matéria orgânica como fonte de nutrientes, aumento da produtividade dos sistemas agrícolas e ainda o incremento de variedades de plantas nos roçados com espécies frutíferas e florestais. Ao todo, foram implantadas 12 áreas de SAF na região, sendo algumas por iniciativa dos próprios agricultores e uma área coletiva de um grupo de mulheres, com objetivo de fornecer matéria prima para produção de doces.
Além da assessoria em SAF, o IPÊ apoia o grupo de mulheres com ações voltadas à formação em associativismo, agroecologia e produção de doces na comunidade, construção de um espaço de beneficiamento de produção, elaboração de uma logomarca de identificação do grupo e de materiais de divulgação, e a comercialização em feiras e pontos em Manaus.
Dentre os intercâmbios, destaca-se que em 2011, um grupo de nove agricultores e agricultoras do Amazonas visitou áreas de SAF diversificadas de agricultores no Acre, e o projeto RECA, em Rondônia, onde há agroindústrias que processam polpas, palmito (pupunha), óleos e sementes das frutas cultivadas nos SAF para comercialização.
Durante as atividades a comercialização é constantemente abordada, discutem-se as diversas formas de canalizar a produção de forma direta, como os programas do governo federal (PAA e PNAE) e feiras em Manaus, assim como a valorização cada vez maior dos produtos da sociobiodiversidade, oriundos da agricultura familiar. Seis agricultores da região iniciaram a participação na feira orgânica de Manaus.
Recursos Necessários
Sementes e mudas de espécies anuais e perenes, manivas, facão, ferro de cova, tesoura de poda.
Resultados Alcançados
- 12 áreas de SAF, com uma diversidade total de 16 espécies de árvores frutíferas, mais de 6 mil mudas de abacaxi, além de mandioca, macaxeira, jerimum, maxixe;
- plantio de feijão caupi no sistema “abafado”, em que os grãos são lançados aleatoriamente na área e, em seguida, a cobertura vegetal da capoeira é picada e disposta sobre o solo;
- diversificação dos roçados com espécies perenes;
- possibilidade de abertura e plantio da roça em qualquer época do ano já que não depende do período seco para atear fogo;
- diminuição de 80% em mão de obra para limpeza das áreas e substituição da enxada pelo facão;
- crescimento, produtividade e vigor das espécies perenes e da mandioca superiores à roça manejada com fogo;
- facilidade no arranque da roça (por ter sido plantada com muita matéria orgânica, ela se desenvolve na "flor" do solo, facilitando assim sua colheita);
- implantação de dois viveiros de mudas;
- interesse dos jovens pela agricultura de base ecológica;
- fortalecimento das organizações produtivas de mulheres e gestão participativa dos empreendimentos e associações;
- valorização do conhecimento e agrobiodiversidade local;
- conservação do solo e da biodiversidade;
- fortalecimento da agroecologia;
- formação e capacitação das mulheres e agricultores de 15 comunidades da região (em torno de 200 famílias), por metodologia participativa, em associativismo, agroecologia, SAF, produção de doces e geléias;
- articulação com IDAM, INCRA, MDA e CONAB para emissão de DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) para inserção nos programas PAA, PNAE e participação em feiras;
- aprimoramento da qualidade dos produtos e dos processos de produção e beneficiamento;
- participação do clube de mães Maria de Nazaré em diversas feiras de âmbito regional, nacional e internacional entre 2009 e 2012, o que tem atuado na autonomia, auto estima e empoderamento destas mulheres;
- participação de agricultores na feira de orgânicos;
- Prêmio Professor Samuel Benchimol e Banco da Amazônia de Empreendedorismo Consciente 2010;
- segundo lugar na etapa regional do Prêmio FINEP de tecnologia social;
- uma das 25 experiências selecionadas no país pelo Departamento de Educação Ambiental do Ministério do Meio Ambiente como boa prática de educação ambiental na agricultura familiar, que foi publicada em livro.
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