Problema Solucionado
Na Amazônia, um dos principais problemas das comunidades ribeirinhas é o isolamento em decorrência de fatores geográficos da região. A distância entre o rural e o urbano chega a 52 horas de viagem de barco. Os custos de deslocamento da produção inviabilizavam qualquer atividade econômica. Além do alto custo de deslocamento, para escoar a produção até os centros urbanos, o ribeirinho tinha que ficar muito tempo longe do seu local de trabalho na busca de mercado.
Por falta de oportunidades para comercialização, as famílias não produziam excedentes para fins comerciais e acabavam realizando atividades ambientalmente erradas como a pesca predatória, a caça comercial de animais silvestres e extração ilegal de madeira, consumidos intensamente pelos regatões. Estes, ainda presentes na região, são comerciantes que se deslocam em barcos, vendendo mercadorias industrializadas à preços exorbitantes, utilizando os recursos naturais como moeda de troca. Neste cenário, havia uma produção sem planejamento, com gerenciamento limitado e sem estrutura para produzir e comercializar, o mercado local era restrito, a produção de baixa qualidade e a comunicação frágil.
Descrição
O espaço de comercialização foi idealizado pelos ribeirinhos, organizados coletivamente, e concretizado por meio de um processo de simples compreensão, fácil aplicabilidade, com custos reduzidos e significativos impactos sociais. Em meio ao modo de vida tradicional, surge esta proposta de desenvolvimento inovador capaz de amenizar problemas sociais, econômicos e ambientais na região do Médio Juruá.
1 – Inicialmente, foi feita uma reflexão sobre a realidade social da população local seguida da conscientização da necessidade de organizar um sistema de comercialização apto a solucionar problemas sociais;
2 – Para implantar um sistema de comercialização viável economicamente, colocou-se em avaliação o volume de produção e os custos de escoamento da produção;
3 – A articulação de parcerias foi um mecanismo impar para operacionalizar a proposta ao possibilitar a divisão de custos e de responsabilidades;
4 – A capacitação dos colaboradores envolvidos foi imprescindível na promoção, incentivo e divulgação da proposta do comércio e da contribuição específica de cada um em ações voltadas para um fim: reduzir as desigualdades econômicas e sociais na região;
5 – Em coletividade, os próprios comunitários definiram os produtos e mercadorias a serem priorizados no processo de comercialização.
Metodologia de funcionamento:
A região do Médio Juruá foi dividida em 13 polos. Cada um destes polos tem um entreposto de comercialização, que consiste em uma construção em madeira medindo 48m2, um rádio fonia com painel solar, computador e impressora sob o gerenciamento de dois comunitários treinados, que atendem três vezes por semana os ribeirinhos agregados ao polo. O atendimento consiste na compra da produção e venda de mercadorias industrializadas.
1. Compras de mercadorias: A elaboração da lista das mercadorias que irão abastecer cada entreposto é feita com base na demanda mensal de cada um que, após somadas, compõem uma lista de compras que é cotada e comprada em Manaus, a preço de atacado. Essa mercadoria é enviada por barco até a sede do município de Carauari. Ao chegar é transferida para o barco da associação dos produtores e em seguida segue para ser entregue nos entrepostos.
2. Viagens de comercialização: Compreendem visitas a todos os entrepostos para a entrega de mercadorias e recebimento da produção. A viagem, que dura em média 12 dias, acontece a cada dois meses. Primeiro é feito o planejamento da viagem, entrega-se as mercadorias nos entrepostos e, simultaneamente, é feita a prestação de contas e o embarque da produção para a sede do município. Esta etapa é concluída com o retorno do barco à Carauari, onde é realizado o desembarque e entrega da produção na sede. O resultado da viagem é sistematizado em um relatório entregue ao presidente da associação.
3. Comercialização nos entrepostos comunitários: O atendimento dos comunitários acontece três vezes por semana em cada entreposto. O produtor leva seu produto até o entreposto, onde é classificado, medido, pesado, registrado e pago. Com base no valor de sua produção, o produtor realiza a compra de mercadorias industrializadas. A produção vendida/trocada pelos comunitários fica armazenada no entreposto e transportada na próxima viagem do barco.
4. Comercialização da produção no polo sede: Caracteriza-se principalmente pela venda dos produtos dos ribeirinhos, vindos dos entrepostos comunitários, à sociedade em geral no atacado e varejo, na sede da Associação, denominada polo sede. Neste ato é feito o registro da comercialização diária, sistematizado uma única vez no fim do mês.
5. Prestação de contas dos entrepostos comunitários: É feita mensalmente a fim de subsidiar a direção da Associação quanto à eficiência do gerenciamento financeiro do comércio. Estes procedimentos compreendem desde a sistematização da comercialização de cada comunitário, levantamento físico do estoque, até o preenchimento de planilhas e o encaminhamento das informações ao polo sede.
Recursos Necessários
Os recursos materiais necessários são:
- um entreposto de comercialização, medindo aprox. 50 m2;
- um barco regional;
- uma mesa e duas cadeiras;
- um computador e uma impressora (opcional);
- um rádio fonia com painel solar (caso não exista outro meio de comunicação).
Resultados Alcançados
o resultado mais impactante alcançado foi a oportunidade gerada a mais de 500 famílias ribeirinhas, que hoje comercializam 100% da produção em seu próprio local de trabalho. Os comunitários, que antes necessitavam se descolar até 52 horas de viagem com alto custo de combustível e perda de tempo para vir à cidade comercializar seus produtos, hoje estão no máximo a 100 minutos de um entreposto comercial onde entregam sua produção e adquirem mercadorias industrializadas a preços mais acessíveis.
A partir de uma pesquisa realizada por duas instituições externas à associação constatou-se que, com a implantação do comércio ribeirinho, os comunitários dobraram o poder de compra. Os mesmos produtos que antes eram adquiridos por R$ 100,00 (cem reais) nos regatões, hoje são comprados com apenas r$ 51,00 (cinquenta e um reais). Outro resultado importante foi a redução do desmatamento e da pressão sobre os recursos naturais explorados de forma insustentável e ilegal, como a caça de animais silvestres, pesca predatória, extração de madeira sem manejo, etc. O comércio ribeirinho não comercializa produtos que degradam o meio ambiente, mas incentiva a produção sustentável e dá condições para práticas sustentáveis, como o manejo de sementes oleaginosas, a extração de látex e práticas de agroecologia. O fato é que os ribeirinhos têm migrado das atividades predatórias ao meio ambiente para práticas produtivas sustentáveis.
A capacitação é, também, um grande resultado. São 28 administradores de entrepostos e 12 diretores da organização capacitados, que compreendem e gerenciam esta tecnologia de inclusão social. Estas capacitações têm fortalecido a organização comunitária. Já foram capacitadas também 417 famílias em boas práticas de fabricação de farinha de mandioca, principal produto comercializado. Estas capacitações melhoraram a qualidade dos produtos e agregaram valor aos mesmos.
Em agosto de 2009 eram cinco entrepostos de comercialização, hoje são 13. Este crescimento deu-se através da utilização de: um barco de médio porte com capacidade de 40 toneladas, e uma balsa de médio porte com capacidade de 150 toneladas.
Estes dados demonstram a eficácia financeira e gerencial desta tecnologia que, comprovadamente tem sido capaz de promover o desenvolvimento local sustentável no médio Juruá.
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