Problema Solucionado
A perda das sementes crioulas significa a perda da biodiversidade e da cultura dos povos, pois a semente, além de ser um alimento, retrata a cultura de cada comunidade, já que é por meio da alimentação que a cultura e o modo de viver de um povo se expressa. Com a revolução verde, iniciada na década de 1960 no Brasil, e a inserção dos pacotes para a agricultura, grande parte das famílias camponesas perderam suas sementes, se tornando dependentes do mercado, com a expropriação das sementes e dos saberes camponeses, o que deixou muitas famílias em situação de insegurança alimentar e nutricional. A Agricultura comercial de monocultivos tem acelerado ainda mais à perda da agrobiodiversidade, pois substitui as sementes crioulas e tradicionais por sementes híbridas e transgênicas altamente dependentes de insumos químicos e fertilizantes. A consequência tem sido a perda das cultivares crioulas, as quais podem contribuir para a agricultura no Brasil e no mundo, por serem adaptadas à realidade local, com grande potencial de produção, utilizando o mínimo de insumos, preservando os recursos naturais e a biodiversidade e garantindo a autonomia das famílias camponesas.
Descrição
As sementes crioulas são as sementes derivadas dos cultivos tradicionais. Estas sementes crioulas ou espécies domesticadas resistem até nossos dias devido ao trabalho da agricultura camponesa num processo de tentativas, acertos e erros em seus cultivos repassados de geração em geração. Também são chamadas de comuns, domésticas, caseiras ou tradicionais. Elas são uma criação coletiva dos povos que refletem a história especialmente das mulheres que foram as primeiras a cultivarem as sementes. Contudo, semente crioula ou nativa é um termo, pois não é reduzido apenas as sementes em si, mas também pode se referir a tubérculos, como batata, cará, mandioca, entre outros alimentos conhecidos. O campesinato sabe que as sementes carregam nas suas entranhas a história de um patrimônio genético pleno de diversidade. As sementes crioulas têm sido guardadas, reproduzidas e melhoradas milenarmente pelas famílias camponesas e povos indígenas em todo o mundo. As sementes têm garantido ao campesinato e para toda a humanidade a diversidade étnico-ambiental que herdamos. Elas mediam crenças nas relações místicas com o sagrado, unem os diferentes quando se fazem alimentos no cotidiano da vida social, insinuam a partilha pelo seu significado de alimento potencial que pode ser repartido entre os que necessitam plantar. Podemos considerar as sementes como o início e o fim dos ciclos da produção camponesa. A diversidade e a existência de sementes permitem assegurar a abundância e a diversidade alimentar em cada localidade, servindo de base para uma alimentação adequada e saudável, permitindo o desenvolvimento das formas culinárias preservadas e desejadas na reprodução cultural dos povos. Portanto, as sementes e o conhecimento associado a elas são partes fundamentais e insubstituíveis da soberania e da segurança alimentar daqueles que as cultivam. O que está em jogo, por trás dessas terminologias, é a soberania alimentar dos povos, a manutenção das culturas locais, e a conservação da natureza para manter o valioso patrimônio genético do qual são detentoras. As comunidades camponesas adotam complexas estratégias para mantê-las, como os mecanismos de seleção, armazenamento e intercâmbio de sementes. A diversidade e a existência de sementes crioulas nas mãos dos camponeses permitem assegurar a abundância e a diversidade alimentar em cada comunidade, servindo de base para uma alimentação adequada, saudável e permitindo o desenvolvimento desejado pelo campesinato. Nesse sentido, a AEPAGO, vem desenvolvendo desde 2007 uma experiência de resgate, produção, multiplicação e distribuição de sementes de variedades crioulas no estado de Goiás, em especial na regional sudeste deste. Está sendo desenvolvido uma proposta que tem como objetivo a recuperação, preservação, multiplicação e distribuição de sementes de variedades crioulas em comunidades rurais do estado de Goiás, assim como, o melhoramento dessas sementes. O objetivo é incentivar práticas agrícolas simples que melhorem a conservação do solo, reduzem a dependência externa, agregam valor às atividades já executadas. Para manter a qualidade das sementes é realizado na propriedade dos guardiões e guardiãs das sementes, o manejo da diversidade genética que do ponto de vista da pesquisa agrícola, consiste em resgatar, avaliar, caracterizar, selecionar e conservar os recursos genéticos de uma espécie. O trabalho de resgate, produção, multiplicação e distribuição de sementes crioulas do MCP é um dos maiores do país. Abrangem diretamente cerca de 300 famílias (produtoras de sementes) e indiretamente mais de 4 mil famílias eu já receberam as sementes crioulas. Já foram produzidas e distribuídas cerca de 800 toneladas de sementes crioulas em Goiás e em outros estados. Em 2011, realizou-se a “ I Feira e Festa das Sementes, Mudas e Raças Crioulas em Defesa da Biodiversidade” e o “Seminário Biodiversidade e Sementes Crioulas” na Universidade Federal de Goiás – Campus Catalão entre os dias 07 e 10 de julho. A Feira contou com 30 barracas de exposição de artesanato, processados, mais de 2000 mudas, 29 raças crioulas e mais de 300 variedades de sementes crioulas, das quais 25 variedades de milho, 12 de mandioca, 5 de arroz, além de sementes e mudas de frutas e flores. E a “II Feira e Festa das Sementes, Mudas e Raças Crioulas em Defesa da Biodiversidade está programada para acontecer em Catalão (GO) de 10 a 12 de setembro deste ano. Ao mesmo tempo em que se resgatam as sementes crioulas são também recuperados saberes, espaços sócioculturais, ritos, mitos e significados que ficaram sepultados na história. Lutar pela diversidade biológica e étnica é reconstruir a relação afetuosa que as sementes crioulas sempre nos proporcionaram. Ao se manusear uma semente preservada pelas camponesas, povos indígenas e quilombolas pode-se sentir a energia da vida que atravessou nossa história. Nesse toque elementar e simbólico se perceberá o porquê a semente crioula é patrimônio da humanidade.
Recursos Necessários
Para a implementação de uma unidade da tecnologia serão necessários:
- organizar as famílias camponesas e fazer a discussão: o que são as sementes, qual sua importância, como multiplica-la e preserva-la (será necessário um local e um data show, se possível) e organizar com as famílias envolvidas um hectare de terra para o plantio das sementes.
- fazer um campo de experimentação para lavoura coletiva de observação e experimentação da semente para que as famílias tenham confiança na tecnologia;
- Adquirir as sementes crioulas (arroz, feijão, milho...), através de uma família ou organização que têm as sementes na comunidade ou ainda através de uma solicitação a organizações ou agricultores que as possuem em outro município, região ou estado.
- Fazer a análise da terra e adquirir insumos para plantio e cobertura;
- Horas de trator para o preparo da terra;
- Organizar mutirões para limpeza e colheita da lavoura, preparação das sementes e armazenamento;
- Embalagens
- Pensar um local para armazenamento (num primeiro momento pode ser na casa de uma das famílias ou cada uma leva sua parte para casa); - organizar banco de sementes crioulas da comunidade ou município;
- Recursos para capacitação das famílias, acompanhamento técnico, dias de campo e bombonas para armazenamento das sementes de uma safra para outra.
Resultados Alcançados
A Agricultura camponesa não é só um jeito de produzir no campo. É um modo de viver. É uma cultura própria de relação com a natureza. É uma forma diferenciada de vida comunitária. O trabalho é familiar. Mas esta forma de agricultura não se define só pela forma como trabalha, a família camponesa vive e sobrevive com pouca terra. Com essas características as sementes crioulas têm concretizados bons resultados ao longo destes 8 anos para as famílias camponesas, tais como: A recuperação da autoestima das famílias camponesas, através da valorização e socialização dos seus conhecimentos com a produção de alimentos através das sementes crioulas; O fortalecimento da identidade e da cultura camponesa, possível com o resgate das sementes, das tradições, dos alimentos, práticas na forma de fazer agricultura; A capacitação política e técnica de mais de 200 guardiões e guardiãs das sementes crioulas através dos cursos, oficinas e encontros realizados; Resgate de centenas de variedades de sementes, mudas e raças crioulas; Melhoramento de variedades de sementes crioulas em parceria com pesquisadores da EMBRAPA; Organização de 5 bancos de sementes crioulas para selecionar e armazenar as sementes crioulas nas comunidades rurais; Implantação de mais 5 campos de experimento de sementes crioulas; Cerca de 4 mil famílias camponesas que receberam as sementes crioulas para plantar, em Goiás e outros estados; Socialização da experiência do MCP com camponeses e camponesas da África, América Latina, América Central e Caribe; Produção e Comercialização através do PAA de 800 mil Kg de sementes crioulas, entre arroz, feijão e milho. Diminuição no uso de insumos químicos e agrotóxicos através do incentivo as famílias camponesas para realização do processo de transição agroecológica; Melhoria da renda dos guardiões e guardiãs das sementes, através da comercialização das suas sementes crioulas; Minimização de custos das famílias camponesas que recebem as sementes e as preservam para plantar no ano seguinte, fortalecendo sua autonomia; Preservação da biodiversidade, através do cuidados com as sementes resgatadas e com o meio ambiente; Realização de 8 seminários sobre biodiversidade e sementes crioulas. Estas práticas estão contribuindo para a construção de um ambiente agrícola sustentável, com a elevação de renda e agregação de valores ambientais e sociais, criando as bases para a construção da autonomia relativa das famílias camponesas.
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