Problema Solucionado
A construção desta tecnologia foi motivada pela necessidade de grupos e coletivos, frente a dificuldades de acesso a financiamentos de baixos valores e com regramento flexibilizado, de custear necessidades individuais ou coletivas. As regras do microcrédito produtivo e orientado e do PRONAF ainda não dialogam com as necessidades de uma parcela da sociedade que se reconhece como economia solidária.
Na década de 1980, constituíram-se no Brasil experiências de fundos para apoio a mini projetos, das quais o Camp participou. Mas somente em 2010, a partir de convênio com a SENAES, o CAMP iniciou o trabalho de assessoria para o fortalecimento e a constituição de fundos solidários coletivos. A partir de então, aprimorou formas, técnicas e campos de atuação, transformando a experiência em uma tecnologia reaplicável em diálogo com as compreensões e técnicas da educação popular. Nos últimos anos, estimulamos a criação de 9 fundos solidários na região sul do Brasil.
A constituição de fundos solidários coletivos trabalha com protagonismo social e hoje se torna ainda mais importante como instrumento de fortalecimento da autonomia de coletivos que defendem os direitos humanos.
Descrição
A metodologia desta tecnologia baseia-se nos pressupostos da educação popular, considerando elementos da vida das pessoas e suas práticas, estudo de aprofundamento da realidade e proposição de ações de transformação das situações-problema.
A primeira oficina ou reunião começa com a técnica da Mandala da Memória, cujo objetivo é conhecer a trajetória e a identidade do grupo. No centro da mandala, se escreve a data de quando o coletivo começou a trabalhar junto. Após, segue-se preenchendo o cartaz por períodos ou anos, identificando os destaques e as dificuldades de cada período. A mandala é encerrada no ano em que se está fazendo o exercício.
Após finalizar a conversa, o grupo é convidado a preencher outro cartaz em formato de carteira de identidade, identificando o objetivo daquele coletivo e sua forma de organização.
Ambos os cartazes servem para traçar o diagnóstico do coletivo, no processo de gestão coletiva de recursos. A experiência tem nos mostrado que um grupo que não possui trabalho conjunto e vivência prática solidária na gestão de seus processos, não tem condições de ter um fundo solidário.
Num segundo momento de atividade, o grupo de assessoria que está contribuindo na construção do fundo solidário retorna com seu olhar sobre o processo que foi realizado, refletindo com o grupo se há ou não acúmulo suficiente para a vivência de um fundo solidário. Em caso afirmativo, neste dia inicia-se a construção das primeiras regras.
A técnica utilizada é uma caixa com blocos de perguntas que dialogam com a distribuição dos temas no regimento interno. As discussões perpassam por:
- Pensar nos órgãos diretivos: assembleia para definições gerais e composição de uma comissão gestora para a gestão cotidiana do Fundo.
- Pensar na alimentação do Fundo Solidário: tipo de recurso a ser utilizado (dinheiro, sementes, animais, trabalho), a fonte deste recurso, normas de contribuição e devolução, carência, inadimplência, juros, etc.
- Definir as políticas e regras de funcionamento: critérios para adesão e exclusão de sócios/as, critérios para seleção da comissão gestora e prestação de contas.
- Definir instrumentos de controle, como: ata específica das reuniões do Fundo, ficha de cadastro, contabilidade mensal e anual, etc.
Em muitos casos, na atividade em que se pensam os instrumentos de controle, se ensina para as pessoas como escrever uma ata, como fazer prestação de contas, entre outras coisas. Tem-se modelos de todos os instrumentais que são socializados com os grupos.
Importante destacar que na última oficina, cuja finalidade é a construção das regras, é escolhido o nome do Fundo Solidário, considerando a finalidade dele e a identidade daquele coletivo.
A construção de todo esse processo é enriquecida com leituras de textos, apresentação em power point com histórico dos fundos solidários, vídeos, documentários, músicas e poesias, de modo a fortalecer a ideia de que aprendemos com todo o corpo e durante toda a vida.
Após o término da construção das regras é importante um tempo para a assessoria transformar as respostas das questões organizativas do fundo solidário em regimento interno. Segundo nossa experiência todo este ciclo envolve aproximadamente 52horas de trabalho, divididos entre a ação com a comunidade, a escrita do regimento interno, apresentação para a comunidade, aprovação e escolha da comissão gestora.
O processo segue com reuniões periódicas da comissão gestora do fundo, captação de recursos conforme o combinado e a realização de assembleias anuais. A procura por assessoria acontece quando há necessidade de fortalecer a captação de recursos. Nestes casos, já contribuímos na reflexão sobre formalização ou não de grupos, moeda social e adequação de regimento interno para compor um sistema de desenvolvimento econômico.
Para esse formato de fundo solidário comunitário, é importante garantir a devolução dos recursos que foram sendo emprestados, pois, como não há uma fonte fixa de captação, se não for bem administrado, o recurso acaba e o fundo esvazia (por isso a importância de regras bem formuladas neste campo).
Neste caso, ele é chamado de fundo rotativo porque envolve a ação do recurso circular entre as pessoas. Outra alternativa que muitos grupos acabam optando é a garantia de uma percentagem de reserva fixa que não é emprestada.
O recurso, se for dinheiro, é guardado em conta bancária específica, em bancos públicos, em nome de pessoas que compõem a comissão gestora do fundo (em caso de grupos informais) ou em nome da associação (em caso de grupos formais). No caso de sementes, ficam guardados em bancos de sementes que são construídos em forma de mutirão. No caso de animais, eles ficam nas propriedades camponesas e seguem o processo rotativo, conforme combinados estabelecidos entre os/as camponeses/as.
Recursos Necessários
- Cartazes com desenhos de mandala em espiral e identidade do grupo
- Papel pardo e cartolina para trabalho em grupo
- Caixa pequena, com questões descritas em pequenos pedaços de papel
- Vídeos e documentários dos fundos solidários no Brasil, disponíveis em sites e youtube
- Modelos de ata, ficha de cadastro, ficha de controle de entrada e saída de recursos, etc.
- Computador
- Impressora
- Cartuchos para impressora
- Folhas de ofício
- Data show
- Quadro
- Canetas coloridas, tintas e pinceis
- Letras de música e poesias
- Passagens aéreas e terrestres
- Locação de espaço físico
- Hospedagem
- Alimentação
- Envelopes e custos com correio
- Educadores/as Populares
Resultados Alcançados
Resultados quantitativos: construção de 07 fundos solidários na região Sul do Brasil:
- Fundo Rotativo Solidário Bom Viver, ligado ao Fórum de Economia Solidária de São Leopoldo/RS, que envolve 14 empreendimentos de economia solidária.
- Fundo Rotativo Solidário Integridade da RESVI, ligado à da Rede de Economia Solidária do Vale do Itajaí / SC (RESVI), que envolve 12 empreendimentos (catadores, artesãos, produtores da agricultura familiar, pessoas da área da saúde mental e povos indígenas).
- Fundo Rotativo Solidário Olhares do Sul, ligado à Rede Olhares do Sul / RS, que envolve 4 empreendimentos.
- Fundo Solidário Resistência da População em Situação de Rua, ligado ao Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR) do RS, que envolve 50 pessoas.
- Fundo Solidário Amigas e Amigos por um Mundo Melhor (Amme), ligado à Cooperativa de Trabalho Educacional dos Amigos por um Mundo Melhor (COOPERAMME), com sede em Itajaí/SC, que envolve 12 pessoas.
- Fundo Solidário das Mulheres Camponesas, ligado ao Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) do RS e Cooperativa de Produção Agropecuária Terra e Vida (COOPERVITA), que envolve 250 pessoas.
- Fundo Solidário Ubuntu, ligado à Cooperativa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana / RS, que envolve 350 pessoas
Quantidade total de pessoas envolvidas: 750 pessoas nos estados de SC e RS.
Enquanto percepções, sentimentos e avaliações, destacam-se os seguintes elementos:
- O processo de gestão de um Fundo Solidário é muito maior do que só a gestão coletiva de recursos, pois envolve o processo de fortalecimento dos coletivos e comunidades envolvidas, que passam a vivenciar na prática a autogestão de seus processos.
- A metodologia utilizada interfere muito no resultado final da ação, ou seja, para garantir um procedimento realmente dialógico e que considere as pessoas e seus processos é importante considerar os pressupostos da educação popular.
- Os Fundos Solidários permitem o exercício das pessoas, de forma coletiva, tomarem nas suas mãos seus processos. Dialoga diretamente com as necessidades de cada grupo, portanto, torna os sujeitos envolvidos protagonistas da experiência, onde as pessoas se tornam responsáveis pelo outro/a e, ao mesmo tempo, pensam o autofinanciamento a partir de suas realidades. Assim, realizam captação externa, mas o mais importante é a captação interna, num movimento educativo de considerar os potenciais de cada lugar e sujeitos envolvidos com a práti
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