Objetivo
Utilizar tecnologias sociais para melhorar a qualidade da água utilizada para consumo humano, que é armazenada em cisternas durante períodos chuvosos e de estiagem.
Problema Solucionado
Antes de atingir as cisternas, diversas impurezas são introduzidas nas águas de chuva durante a passagem desta pela atmosfera, carreando materiais em suspensão e dissolvendo possíveis gases poluentes da atmosfera, e telhado e calhas, que podem conter impurezas depositadas, como fezes de animais, restos de folhas, poeira, etc. O conceito de se desviar os primeiros milímetros de cada chuva não é novo, mas boa parte dos dispositivos existentes é de difícil instalação e operação, principalmente no tocante à vedação. Por esta razão, quando instalado, em decorrência dos problemas operacionais, os moradores acabam abandonando e desconectando o dispositivo do sistema de coleta de água. Além disso, os moradores são orientados, quando do recebimento das cisternas dos diversos programas de governo, a realizar manualmente o descarte das primeiras águas de chuva, no início de cada evento chuvoso, independente do horário em que se inicie. O dispositivo desenvolvido no âmbito desta pesquisa é simples e faz o descarte de forma automática, de modo que os moradores se isentem da preocupação de levantar, muitas vezes de madrugada, para desviar as águas que levariam impurezas às cisternas.
Descrição
O dispositivo, dimensionado para desviar o primeiro milímetro de chuva, foi confeccionado em tubos e conexões de PVC, objetivando uma montagem simples e rápida, mas garantindo, também, estanqueidade. No início da precipitação, o sistema deve estar completamente vazio para receber as primeiras águas de chuva que lavam a atmosfera, o telhado e as calhas. Neste momento, com base no princípio de vasos comunicantes, os tubos são cheios até atingir a capacidade total do dispositivo, cujo volume é calculado em função da área do telhado. Em seguida, a água com níveis de impurezas reduzidos é encaminhada à cisterna. Ao final de cada evento chuvoso o dispositivo deve ser esvaziado manualmente para funcionar plenamente na próxima chuva.
O dispositivo desenvolvido foi instalado em uma residência localizada na cidade de Pesqueira-PE, cujo telhado apresenta inclinação de 27% e área igual a 50,77 m2, o que resultou em 6,5 m de tubos para armazenar 1 mm de precipitação. O objetivo foi analisar o comportamento e a eficiência do dispositivo, acompanhando as variações na qualidade da água durante o percurso até a cisterna da residência. Esses experimentos foram realizados durante dois eventos de chuva ocorridos em dois anos consecutivos, na mesma época do ano (entre os meses de agosto e setembro).
Quando do início de um evento de precipitação foi coletada amostra de água nos pontos A (água da chuva, coletada em recipiente de plástico, desinfetado com álcool 70%), B (água que passou pelo telhado e calhas), C (água do interior do desvio), D (água encaminhada a cisterna) e E (água armazenada no interior da cisterna). Os seguintes parâmetros foram analisados, de acordo com o Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater (APHA, 2005), em todas as amostras: cor real e aparente; turbidez; pH e alcalinidade; sólidos suspensos totais – SST; coliformes totais e E.Coli; e bactérias heterotróficas, com frequência mensal. A contagem de bactérias heterotróficas totais foi realizada através do método pour plate. O meio utilizado foi o ágar nutriente para contagem em placas, sendo as amostras incubadas em estufa bacteriológica a 35°C, por 48 horas (APHA, 2005). Após o tempo de incubação, foi utilizado um contador manual de colônias para a contagem de Unidades Formadoras de Colônias (UFC). O material de coleta foi esterilizado (120ºC e 1atm, por 20 min) e o morador da residência foi instruído sobre os procedimentos de coleta.
Uma das primeiras atividades desenvolvidas no âmbito deste projeto foi o levantamento das famílias que poderiam ser envolvidas dentro da área de atuação da pesquisa. Neste contexto, foram obtidas informações sobre famílias residentes em comunidades rurais localizadas na região da bacia escola do município de Pesqueira, com a aplicação de questionários que abordaram aspectos técnico-sócio-econômicos dos moradores.
Recursos Necessários
O material utilizado para confecção do dispositivo é constituído basicamente de conexões de PVC para esgoto, que deverá ser conectado às calhas de PVC e à tubulação que transportará a água até a cisterna. O dimensionamento da quantidade de tubos que deverão ser conectados em série depende da dimensão da área do telhado de captação da água de chuva.
Resultados Alcançados
Nos dois experimentos realizados observou-se influência nos parâmetros provocada pelo desvio do primeiro milímetro de chuva. Em relação à turbidez os valores obtidos após o desvio (ponto D), em ambos os experimentos, comparados com os valores obtidos no interior do desvio, ponto C, indicaram que o dispositivo de descarte foi eficiente em reter partículas em suspensão, com eficiência iguais a 62,4% e 49,6%, respectivamente para os anos 1 e 2. Observou-se ainda que em ambos os experimentos os valores encontrados nos pontos após o desvio e no interior da cisterna estiveram de acordo com o padrão de potabilidade estabelecido pela Portaria do Ministério da Saúde Nº 2.914/2011 que limita a turbidez em 5 UNT na rede de distribuição.
Os resultados obtidos para coliformes fecais e bactérias heterotróficas totais confirmam a importância do desvio das primeiras águas de chuvas como barreira sanitária na melhoria da qualidade da água armazenada em cisternas. Foi observada remoção de coliformes totais de 96,5% (do ponto B ao ponto D). Quando a referência passa a ser bactérias heterotróficas, a redução foi de 37,3% no ano 1 e 44,8% no ano 2, entre os pontos B e D. O resultado mais importante do ponto de vista o uso da água de chuva para consumo humano reside na não detectação de E.Coli nas amostras após o desvio em ambos os anos de avaliação, o que reforça a funcionalidade do desvio com relação a remoção de organismos patogênicos.
Adicionalmente, experimentos realizados com precipitação simulada indicaram que o dispositivo de desvio promoveu a remoção de 93,2; 93,7; 98 e 100%, respectivamente de cor, turbidez, coliformes totais e E.Coli. Os resultados do projeto foram exibidos no Jornal Nacional em 03/11/2011, e nesta reportagem, em seu depoimento, a Sra. Maria revela que depois que a UFPE instalou o dispositivo de desvio na sua residência, a família não sofreu mais com “dor de barriga”. Esse depoimento mostra como um dispositivo simples e barato, pode beneficiar milhares de brasileiros, levando saúde às famílias que consomem água de chuva armazenada em cisternas. Destaca-se que o desvio do primeiro milímetro de chuva é extremamente importante para garantir o encaminhamento de água de boa qualidade às cisternas. Isso consolida o dispositivo de desvio como tecnologia social de aplicação imediata e fácil replicação.
Público atendido
Quilombolas
Agricultores Familiares
Afrodescendentes
Assentados Rurais
Crianças
População em Geral
Comentários