Objetivo
Captar água das chuvas em áreas rurais de encostas, prevenindo e revertendo processos erosivos, recuperando áreas degradadas, revitalizando nascentes, mananciais e córregos, gerando sustentabilidade hídrica e segurança alimentar e, assim, viabilizando a permanência das famílias para a área rural pela geração de alimentos, trabalho e renda.
Problema Solucionado
Após desmatamento para novas lavouras e pastagens, solos ricos rendem, nos primeiros cultivos, alta produtividade e densidade de gado. Nas chuvas, o pisoteio provoca impermeabilização, reduzindo a infiltração e resultando em escorrimentos superficiais e em erosões, que podem chegar a voçorocas. As erosões laminar e sulcada são de difícil reversão e levam ao assoreamento de corpos d’água e ao empobrecimento do solo, da propriedade e da família, resultando em êxodo rural.
A reversão de voçorocas é ainda mais desafiadora, pois as enxurradas entram em forma de cachoeira, desbarrancam suas margens e avançam a cada ano.
A curva de nível é muito usada no controle e prevenção erosão, mas são difíceis de construir em encostas acentuadas, pois o maquinário móvel (patrol) derrapa. A Curva de Nível com Cochinho (CNC) foi desenvolvida usando retroescavadeira, que trabalha estática e apoiada em pernas estabilizadoras.
Uma tecnologia social importante para recuperar áreas degradadas é a Barraginha. Entretanto, ela está limitada inclinações de até 12%.
A Embrapa desenvolveu a CNC para recuperar áreas de maior declive (12-25%) e na forma de cordões capazes de cercar e zerar as enxurradas em uma área.
Descrição
Em 2014, a Embrapa Milho e Sorgo recebeu demanda de uma comunidade do dist. de Morro do Ferro (MF), em Oliveira-MG, para a recuperação de uma área degradada por enormes voçorocas. A Embrapa vinha desenvolvendo, desde 1998, um trabalho para controle de pequenas e médias voçorocas utilizando Barraginhas para impedir a entrada de enxurradas e, assim, interromper o avanço delas. Após ir a Sete Lagoas-MG (SL) conhecer nossa experiência (teoria e prática), a delegação de MF se convenceu da viabilidade de controlar suas voçorocas (Link 1-L1, ver anexo). Foi realizada uma reunião em MF para apresentar a proposta à comunidade e, um mês depois, iniciaram-se os trabalhos (L2).
Na reunião, apareceram 2 propriedades disponíveis: Sr. Gilmar e Sr. João. Na 1ª, observamos vestígios de tentativas de solução anteriores: tinham construído valas rasas que desviavam as enxurradas, mas, onde desaguavam, iniciava-se uma nova voçoroca.
Nesses vestígios de regos, adaptamos pequenas gamelas de 12 m de comp. por 3 m de larg. e 1 m de prof. Saltava 15 m e voltava a fazer gamelas, como contas de um colar. Assim, na hora da chuva as enxurradas corriam para a vala e escorriam para as gamelas, sem desaguar mais no final. Dava tempo de infiltrar tudo entre uma frente de chuva e outra. Os barrancos das voçorocas não avançaram mais, iniciando-se um processo de cicatrização do solo. E esverdeou.
No terreno do Sr. João, foram construídas 5 Barraginhas numa pastagem acima de uma enorme voçoroca, que contiveram as enxurradas mais visíveis. Para conter as capilares quase imperceptíveis, reproduzimos o que havíamos feito na propriedade do Sr. Gilmar, porém, nessa não havia os vestígios de vala. Usando retroescavadeira, foi aberta uma vala rasa e estreita com de 300 m de comp., 70 cm de larg. e 40 cm de prof., paralela à borda da voçoroca, mas afastada 15 m. Nessa vala, foram feitas as gamelas, saltando agora 10 m entre elas. Nos 300 m coube 15 gamelas (Fig. 1, ver anexo). A vala recebia as enxurradas capilares da pastagem que não eram captadas pelas Barraginhas. Assim, que uma gamela enchia, vertia o excesso de água para as vizinhas.
O sistema foi capaz de interceptar todas enxurradas menores, cessando o avanço da voçoroca. Produtores que consideravam suas terras perdidas para a degradação recuperaram a esperança de se manterem em seu local e atividades de origem.
Em 2016, a Embrapa recebeu da comunidade do Berto na Serra do Cipó em Jaboticatubas/MG uma demanda para construção de Barraginhas em uma área de encostas acentuadas. Em 70% da área era inviável construí-las, pois tinham declive maior que 12%. Como a experiência em MF estava demonstrando bons resultados, veio a ideia de testar, nas encostas da S. do Cipó, o mesmo sistema de valas com gamelas.
Em reunião organizada pela ONG AMANU com a comunidade, apresentamos a novidade e propusemos de testá-la nesse novo contexto. O Sr. Antônio de 78 anos gostou e topou dizendo “eu venho remoendo a cabeça há anos e aparece a solução aqui na varanda de minha casa”, e selamos o acordo (L3).
Iniciamos, mas já com ideias evolutivas em relação a MF. Estaqueamos curvas em nível e começamos a rasgar, em vez de gamelas, cochos mais estreitos com 6 m de comp., 70 cm de larg. e 70 cm de prof.; saltamos maciços de 3 m rebaixados em 20 cm na crista, para que o cocho que recebesse enxurrada sangrasse os excedentes aos vizinhos (Fig. 2). O espaçamento entre as paralelas obedeceu os mesmos critérios das curvas de nível tradicionais (CNT).
Ao mudar do formato de gamelas (mais abertas e fundas) para cochos pequenos, estreitos e rasos, passamos a denominar a tecnologia de “Curvas de Nível com Cochinhos” (CNC) e pegou (Fig. 3). Logo após a 1ª estação de chuvas, os antigos minadouros do Berto voltaram. As CNC criaram franjas úmidas abaixo delas, proporcionando plantios de canavial, café, milho, capineiras, batata doce e feijão andu, gerando trabalho e renda para os produtores da região e expectativa para planos futuros (L4).
A maior vantagem das CNC em relação às CNT é que elas dificilmente se rompem e, se romperem, vasa somente o volume de um cochinho.
O sistema instalado no Berto foi um sucesso, porém está a 120 km de SL. Para facilitar as visitas e treinamentos da Embrapa, na comunidade da Estiva em SL foram instaladas dez CNC, que passaram a receber delegações para aulas práticas (L5).
Desde 2018, essa tecnologia vem sendo apresentada em capacitações da Embrapa para centenas de técnicos, estudantes, extensionistas e produtores. Em uma delas, ministrada para 20 técnicos e operadores de retro de 10 municípios do Espírito Santo, iniciou-se uma importante parceria com a Sec. de Meio Ambiente de Atílio Vivácqua (L6). Liderado pelo sec. Márcio Menon. O município vem implantando sistematicamente as CNC em toda a zona rural, recuperando solos de pastagens em encostas degradadas (L7) recarregando o lençol freático para revitalização de nascentes e aumentando a sustentabilidade hídrica da região, beneficiando mais de 60 famílias.
Recursos Necessários
Para iniciar a implantação de Curvas de Nível com Cochinhos são necessárias pelo menos duas pessoas capazes de estaquear curvas de nível tradicionais, seja utilizando aparelhos topográficos (Nível Óptico) ou utilizando mangueiras de plástico transparentes (nível de pedreiro).
As curvas são marcadas com estacas de bambu de 20 em 20 metros para guiar a máquina no eixo da curva de nível.
A máquina indicada para construção das CNC é a retroescavadeira, disponível em quase todas as prefeituras do país. Eventualmente, pode ser utilizada também a giratória de esteira, mas não é tão comum quanto a retro.
Uma hora de retroescavadeira rende de 30 a 40 m de CNC: em encostas de até 12% de declividade a máquina dificilmente desalinha no caminho estaqueado, rendendo 40 m por hora; enquanto em encostas de 12 a 25% demanda mais ajustes de alinhamento da máquina, rendendo cerca de 30 m por hora.
Nos municípios que já implantaram CNC, foram experimentadas diferentes modalidades de custeio: A) a prefeitura entra com a máquina e o operador e as famílias beneficiadas entram com o óleo diesel; B) a prefeitura custeia tudo, máquina, operador e óleo diesel; C) a prefeitura entra com a máquina e operador e o governo do estado com o óleo (ocorreu no ES); D) o Ministério Público custeia tudo, máquina, operador e óleo diesel; E) agricultor ou empresas privadas custeiam todo o serviço por conta própria.
Resultados Alcançados
Considerando as Curvas de Nível com Cochinhos construídas no desenvolvimento da tecnologia, nos treinamentos feitos pela Embrapa e pelos parceiros e chegando à ponta, aos municípios que as adotaram, estima-se, hoje, que foram implantados aprox. 31.320 metros lineares de CNC em 4 estados. O acompanhamento é feito diariamente, pela interação direta da Embrapa com todos os munic. que já realizaram treinamentos e enviam fotos, vídeos, depoimentos e postagens em redes sociais. Também recebemos relatos de parceiros que treinaram outros munic., conforme detalhado a seguir:
- Fase de Desenvolvimento (2014-16)
MG
Oliveira: 700 m
Jaboticatubas: 500 m
Sete Lagoas: 800 m
- Nº de pessoas capacitadas pela Embrapa (2017-23): total 144
Angelândia-MG: 5
SENAR-MG: 15 (L8)
Sicoob de S. D. das Dores-MG: 2
10 munic. do ES (entre eles, Atílio Vivácqua): 20
22 munic. de MG: 45 (L9)
Incaper-ES: 20
SENAR (GO, BA, MG, MA, RN, ES e DF): 17 (L10)
Sete Lagoas-MG: 15, sendo 2 da GosFlorestal
Progen/F. Renova: 5
As capacitações na Embrapa é que deram lastro para medição quantitativa das CNC já construídas. Atílio Vivácqua (AV) do ES virou referência desse sistema. Apenas lá foram beneficiadas 60 prop rurais ultrapassando 18.000 m (L 11). O munic. capacitou outros 11 do ES (Alegre, Iconha, R. Novo, Colatina, Laranja da Terra, C. Itapemirim, C. do Castelo, S. Leopoldina, P. Kenedy, Pocrane, P. Canário), e cada um construiu em média 120 m de CNC, somando 1.320 m.
Outros munic. treinados acompanhados:
ES
S. Tereza: 700 m
Aracruz: 1700 m (L12)
MG
S. Dumont: 470 m
Sacramento: 300 m
G. Valadares: 250 m
A GosFlorestal vem construindo CNC, somando 7.050 m:
MG
Rib. Vermelho: 250 m
Barbacena: 500 m
P. de Morais: 5.750 m
Almenara: 250 m
ES
Viana: 80 m
João Neiva: 150 m
BA
Macarani: 60 m
Em todas as voçorocas onde as CNC foram implantadas houve um efeito imediato de cessar o avanço das erosões. Com o tempo, as áreas degradadas, umedecidas pela infiltração das chuvas, começaram a se revegetar naturalmente (Fig. 4).
Já nas encostas degradadas, as CNC promoveram a recuperação do solo e das pastagens, proporcionando agricultura em áreas que já eram tidas como perdidas para os agricultores e houve vários relatos de recuperação de nascentes abaixo das CNC (L13). A tecnologia está tendo uma grande aceitação nas comunidades de MG e do ES, já começando sua difusão para outras regiões do Brasil como MT e RO (L14) (Fig. 5 a 20). O SENAR-MG difunde CNC artesanais em recuperação de nascentes (L15).
Público atendido
Agricultores familiares
Agricultores
Empreendedores
Famílias de baixa renda
Lideranças comunitarias
Organizacao nao governamental
Produtores rurais pequenos
Trabalhadores rurais
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