Problema Solucionado
A história da organização dos catadores integrantes da Rede Solidária Cata-Vida tem o mesmo ponto de partida que tem marcado a vida de catadores em todo o País: a necessidade de gerar trabalho e renda para cidadãos desempregados em busca do sustento de suas famílias, ou de melhores condições de vida e de trabalho para catadores atuando em lixões ou nas ruas, trabalhando de forma isolada e precarizada, totalmente submetidos à exploração no mercado de recicláveis. A organização destes trabalhadores em cooperativas se deu em cidades que não possuíam coleta seletiva, sendo a iniciativa dos catadores a única experiência existente de gestão dos resíduos sólidos nas localidades. As cooperativas criadas enfrentavam as mesmas dificuldades geradas pela falta de infraestrutura, que impediam a ampliação da coleta nas cidades e ocasionavam pouco volume de materiais coletados e comercializados. Atuando de forma isolada, as organizações eram dependentes dos atravessadores porque não acumulavam volume suficiente de materiais para comercialização direta com empresas recicladoras, acarretando a venda de materiais a baixos preços e gerando, em consequência, baixa renda aos catadores.
Descrição
Em 1999, lideranças do Ceadec e da Paróquia Cristo Rei, em Sorocaba, ajudaram a organizar trabalhadores desempregados da comunidade. Desta ação articulada nasceu a Cooperativa de Reciclagem de Sorocaba (Coreso). Em municípios vizinhos, o Ceadec também promoveu encontros com desempregados, onde a saída apontada foi a organização em cooperativas na área da reciclagem. Na mesma região, em municípios como Itapeva e Capão Bonito, lideranças de Pastorais também se articularam com voluntários para apoiar a organização de catadores que atuavam em lixões ou coletavam papelão de forma precarizada nas ruas. Para enfrentar as dificuldades das cooperativas recém-criadas com a falta de infraestrutura, o Ceadec, em ação conjunta com os catadores da Coreso, tomou a iniciativa de articular a integração da comercialização dos materiais coletados pelas cooperativas de municípios vizinhos a Sorocaba. Centralizando os materiais coletados pelas cooperativas na Coreso, em Sorocaba, as organizações começaram a acumular maior volume e a vender os materiais com melhores preços no mercado. A ideia foi levada para outras organizações de catadores e seus apoiadores durante o Encontro Regional de Catadores, promovido pelo Ceadec em 2001, em Votorantim, onde a iniciativa foi abraçada por cinco organizações pioneiras da Rede, localizadas em Sorocaba e municípios vizinhos. Com a formação da Coordenação Regional dos Catadores criava-se, naquele encontro de 2001, a primeira rede de catadores de materiais recicláveis do país: a Rede Solidária Cata-Vida. Ao integrarem as cooperativas em uma Rede, os catadores romperam com o isolamento e a exploração a que estavam submetidos, aumentaram o volume de materiais coletados, passaram a comercializar os materiais diretamente às empresas recicladoras, conquistando melhores preços no mercado e melhoria na renda. Também firmaram parcerias para fortalecer seus empreendimentos econômicos solidários, a tal ponto que hoje são também recicladores: o processo de verticalização da coleta seletiva, com a implantação das Unidades de Beneficiamento do Óleo Residual de Fritura e dos Polímeros PP e PE, elevou a Rede Solidária Cata-Vida a um novo patamar na cadeia produtiva da reciclagem. A Rede Solidária Cata-Vida comercializa em rede diferentes tipos de resíduos – papéis/papelão, vidros, plásticos diversos, metais, óleo residual de fritura - coletados pelos catadores e catadoras das cooperativas integradas nos municípios das regiões de Sorocaba e Itapeva. Nas cooperativas e em cada município, os catadores prestam os serviços de coleta seletiva porta-a-porta - nas residências dos moradores e nos geradores coletivos (condomínios residenciais, escolas, bancos, fábricas, empresas, estabelecimentos comerciais e instituições e órgãos públicos); triagem dos materiais; além do beneficiamento dos materiais Óleo Residual de Fritura (filtragem e clarificação) e Polímeros PP e PE (lavagem, secagem e moagem para transformação em flakes). Para praticar a comercialização conjunta, as cooperativas discutiram e implantaram uma logística de coleta, transporte e comercialização dos materiais recicláveis em Rede, ancorada num processo que permite o relacionamento direto com os moradores e sua adesão à coleta seletiva, no desenvolvimento de um sistema cooperativo integrado em rede de gestão solidária e na humanização do trabalho dos catadores e catadoras, em todas as suas etapas. Desde sua criação, a Rede Solidária Cata-Vida é gerida pela Coordenação Regional dos Catadores - também denominada Diretoria Ampliada da Rede, hoje formalizada como Cooperativa Central - formada por representantes de todas as cooperativas integradas, que se reúnem mensalmente para discutir, planejar, decidir, executar e avaliar todos os passos da Rede. A Carta de Princípios é o documento-base que norteia os rumos da Rede e seus empreendimentos. A gestão em Rede também se concretiza por meio da ação de catadores-facilitadores que compartilham a experiência acumulada ao longo dos anos com novos cooperados e acompanham periodicamente o trabalho cotidiano nas cooperativas. A gestão em Rede se expressa ainda no processo de formação cidadã e de qualificação social e produtiva dos catadores e de educação ambiental com as comunidades envolvidas. Para sensibilizar as comunidades sobre a importância da separação do material reciclável são utilizadas diferentes ferramentas: mutirões de cadastramento das residências; carrinhadas pelas ruas das cidades; palestras em escolas, igrejas e centros comunitários; eventos e exibição de vídeos socioambientais da Rede Cata-Vida; distribuição de materiais informativos; divulgação sistemática das ações e da importância da coleta seletiva em meios de comunicação. Desta forma, as comunidades são constantemente chamadas pelos catadores a exercerem a cidadania de forma ativa, cumprindo o importante papel que a Política Nacional de Resíduos Sólidos reservou na responsabilidade compartilhada na gestão dos resíduos sólidos.
Recursos Necessários
É necessário articular parcerias com o poder público local; sensiblizar e realizar reuniões e oficinas com grupos de catadores para formação e estruturação das cooperativas; elaborar Carta de Princípios para o trabalho em Rede; instituir a Coordenação de Catadores para a gestão da Rede; elaborar plano de ação da Rede com logística de coleta, transporte e comercialização conjunta dos materiais, sistema de controle e monitoramento e de fluxo de informações entre as cooperativas; realizar capacitação continuada dos catadores em cooperativismo, abordagem qualificada junto aos moradores, padronização dos materiais recicláveis e noções básicas de contabilidade; produzir materiais informativos e educativos sobre coleta seletiva; realizar mutirões de cadastramento de residências para adesão à coleta seletiva. Parcerias são necessárias para dotar cooperativas da infraestrutura básica: galpão que funcione como sede da organização e espaço para manejo dos materiais; carrinhos e/ou caminhão para coleta porta-a-porta; equipamentos de triagem, beneficiamento e transporte dos materiais, como mesas, bags, prensas, balanças, empilhadeira; além de uniformes e equipamentos de proteção individual para os catadores e materiais de divulgação sobre a coleta seletiva. Para o trabalho em Rede, são necessárias caçambas, caminhão e empilhadeira para transporte e carregamento dos materiais das cooperativas até o espaço onde funcione uma central de armazenamento e comercialização conjunta da Rede.
Resultados Alcançados
A Rede Solidária Cata-Vida alcançou resultados significativos para a vida de centenas de trabalhadores e suas famílias, começando pela retirada do trabalho insalubre nos lixões e passando pela geração de renda para trabalhadores desempregados e em situação de exclusão, com a criação da possibilidade de atuarem de forma organizada e em cooperativa, onde têm deveres como todos os cidadãos, mas também direitos garantidos. Além da inclusão sócio-produtiva, o processo da atuação em Rede tem possibilitado a formação e a capacitação, a qualificação técnica e profissional e a valorização do trabalho dos catadores nos municípios. A infraestrutura conquistada pela Rede tem diminuído o esforço físico, melhorando condições de trabalho e saúde dos catadores e possibilitando maior agilidade no acondicionamento, movimentação e transporte dos materiais. A Rede começou atuando em 05 cidades e hoje está presente em 10 municípios, integrando 231 catadores e catadoras nas cooperativas integradas, com renda média de R$ 954,00 mensais e comercializando em conjunto uma média de 290 toneladas/mês de materiais. A atuação em Rede fortalece os empreendimentos dos catadores, ajuda a conquistar e ampliar parcerias, motiva a adesão de novas cooperativas e inclusão de mais catadores e mobiliza cada vez mais as comunidades para a participação na coleta seletiva. Sob os princípios da economia solidária, os catadores gerem as cooperativas e a Rede e também protagonizam todo o processo de reciclagem do PP e PE, desde a coleta até a comercialização da matéria prima produzida. O processo de verticalização da coleta seletiva visa fortalecer os empreendimentos, com abertura de novos mercados, melhoria da renda e inclusão de novos catadores. Com essa perspectiva, lideranças do Ceadec, da Rede Solidária Cata-Vida, do Centro de Referência em Cooperativismo e Associativismo de Campinas e da Rede Reciclamp articularam e colocaram em prática a primeira experiência de trabalho Inter Redes de Catadores do país, utilizando coletivamente a Divisão Polímeros da Rede Cata-Vida para processar e comercializar os polímeros coletados pelas cooperativas das duas Redes. A atuação Inter Redes aponta para a necessidade de melhoria na logística de coleta e triagem dos materiais beneficiados e da participação de outras Redes de Cooperativas neste Consórcio de Inclusão Produtiva Solidária que está sendo articulado, tendo em vista o atendimento às oportunidades geradas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos.
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