Problema Solucionado
A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil mostra que o país perdeu quase 90 milhões de leitores entre os anos de 2007 e 2011. Esse empobrecimento literário é ainda mais preocupante entre crianças, onde a queda foi de 8,5% para 6,4%. Já na pesquisa realizada pela ONG Casa da Árvore (Marco Zero de Leitura, 2014), no que se refere à leitura literária, é quase inexistente a influência e motivação da escola.
A situação torna-se ainda mais preocupante quando percebemos que, além de estarmos lendo menos estamos lendo pior. Segundo o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) cerca de 20% das escolas onde atuamos encontram-se em situação de alerta ou atenção. O nível de proficiência em Língua Portuguesa para as séries iniciais do ensino fundamental, em algumas escolas chega a ser de 175, ainda distante da meta do Ministério da Educação, que é de 200.
Mas se a leitura é uma das principais ferramentas para construção da cidadania, como compreendê-la em uma sociedade onde as telas e as redes sem fios estão cada vez mais presentes na construção da nossa visão de mundo? Como a escola pode se apropriar da cultura digital e ressignificar seu papel na formação de leitores?
Descrição
O projeto E se eu fosse o autor? é um programa de ações integradas ao calendário escolar. Apesar de propor uma estrutura básica de formação de professores e atividades para alunos no contraturno, as estratégias de implementação são definidas a partir do Projeto Político Pedagógico da rede. Assim favorecemos o diálogo com as politicas públicas e possibilitamos uma aprendizagem mais significativa.
Para isso promovemos um laboratório metodológico onde os diagnósticos sobre a comunidade escolar em questão servem de base para uma análise e identificação de demandas e prioridades quanto ao incentivo à leitura. Da mesma forma a análise dos resultados da tecnologia social em outros contextos ajudam identificar estratégias e abordagens de reaplicações que podem ser úteis ao novo desafio.
Construímos assim as duas linhas de ação: um programa de formação de professores (Escola Criativa Digital) e o Laboratório Criativo de Leitura e Tecnologia (Lab Criativo), uma ação que amplia a jornada de aprendizagem do aluno por meio de projetos desenvolvidos por ele mesmo e seus amigos fora do ambiente escolar.
O foco do programa Escola Criativa Digital é levar o professor a refletir sobre sua vivência cultural tecnológica e ampliá-la a partir de experiências motivadas por desejos pessoais e por reflexões sobre a prática docente (NÓVOA, 2002, MARTÍN, 1998). A partir dessa imersão é construído o itinerário de descoberta, motivado por um desafio comum: aproveitar experiências em cultura digital para ampliar a capacidade de leitura crítica e participação social de crianças e adolescentes. Esse itinerário é constituído por:
I - Lab de Inovação: Formação imersiva com 30 horas/aula, dedicada a ampliar habilidades didáticas e tecnológicas dos professores por meio de experiências práticas de concepção, planejamento e mediação de projetos de leitura e cultura digital. O grupo em formação explora as dimensões de leitura e autoria existentes em processos digitais e linguagens híbridas. O objetivo é construir “soluções” didáticas para problemas da sua rotina enquanto formadores de leitores (FREIRE, 1998), refletindo sobre os caminhos e ferramentas escolhidas, bem como suas formas de uso (PAPERT, 1994). Ao final desse percurso, recorrem às demandas curriculares para criarem seus projetos, que integrarão ainda todas outras formas de ensino “não tecnológicas” (SANTAELLA, 2011).
II Acompanhamento: Organizamos um calendário de encontros individuais dentro dos horários de planejamento escolar de cada professor para aprimoramento das estratégias didáticas e ampliação da formação a partir das demandas dos projetos em desenvolvimento.
III Mediação experimental: Etapa realizada dentro da sala de aula como estratégia de garantir suporte aos professores em sua primeira experiência de reaplicação desta tecnologia social.
IV Autoria didática: As experiências de concepção e mediação de projetos são sistematizadas em forma de planos de aula que são publicados e compartilhados com o objetivo de favorecer novas reaplicações espontâneas.
Já o Lab Criativo é a ação onde estimulamos os alunos a explorarem ambientes virtuais, recursos digitais e linguagens multimidáticas para construírem novas experiências de leitura. Acreditamos que nesta experiência de leitura crítica da realidade e da própria mídia digital, crianças e adolescentes compreendem as oportunidades de emancipação e, sobretudo, dos riscos de serem conduzidos, involuntariamente, pela avalanche tecnológica para a vala comum do conformismo e da superficialidade. (LIBÂNEO, 1998, FREIRE, 1998).
Na prática o Lab Criativo é um ambiente de aprendizagem colaborativa montado a partir da ocupação de um espaço público (biblioteca, centro cultural ou telecentro). Nele propomos a produção de conteúdos e produtos multimídia a partir de experiências de leitura literária. Para isso o grupo conta com um acervo literário impresso e digital com obras indicadas pelos participantes, computadores, celulares e acesso livre à internet.
São formadas duas turmas a cada semestre, com até 20 participantes cada. As vagas são oferecidas em toda a rede escolar e divulgadas através da realização de oficinas de mobilização. Durante o semestre letivo, os participantes se encontram duas vezes por semana no contraturno da escola. A mediação é realizada por uma dupla de educadores da ONG, enquanto o acompanhamento e o contato com a família e a escola é realizado pelo coordenador pedagógico.
A mediação de leitura conduzida a partir da exploração de novos suportes e formatos para os textos. Assim buscamos integrar a função didática a função social da leitura (LENNER, 2003).As produções de vídeos, livros digitais, ações em redes social e a criação de mapas digitais e outras publicações servem como fio condutor descoberta de vocações e o desenvolvimento de habilidades. Desta forma, integrando a cultura literária a tecnologia, iniciamos essas crianças nas práticas democráticas, promovendo uma cultura de argumentação (GONET,2007)
Recursos Necessários
O E se eu fosse o autor? é uma tecnologia social que pode ser implantada como estratégia para o desenvolvimento da cultura de inovação em redes públicas de ensino bem como em uma única comunidade escolar ou projeto social de educação.
As ações são distribuídas entre ambientes escolares (sala de aula, sala de professores, etc) e um ambiente não-formal de aprendizagem o Lab Criativo. Para montagem do Lab Criativo é necessário um espaço de pelo menos 70 m2, com capacidade para abrigar 20 pessoas, equipados com mesas para trabalho coletivo, cerca de 10 computadores, conexão de internet sem fio, cerca de 4 smartphones ou câmeras digitais, acervo literário impresso com pelo menos 50 títulos e projetor.
Vale lembrar que nos ambientes escolares todas as atividades são construídas a partir da realidade de infraestrutura tecnológica existente, porém, o acesso à internet banda larga é condição fundamental para a implementação da tecnologia social.
Resultados Alcançados
O E se eu fosse o autor? é uma tecnologia social que há 5 anos é continuamente aprimorada por meio de reaplicação em ações regulares nos estados de Tocantins, Goiás e Minas Gerais. Já são quase 2100 atendidos diretamente, sendo cerca de 120 professores.
A exemplo da rede municipal de Senador Canedo-GO (2014-2015), conseguimos ampliar o índice de leitura espontânea entre alunos do 6° ao 9°. Antes de participarem do projeto 27% dos alunos não haviam lido literatura nos últimos 3 meses enquanto outros 53% lembraram com dificuldade apenas de 1 obra. Ao final do projeto 64% lembraram com facilidade de 2 a 5 livros e outros 36% leram mais de 6 obras no mesmo intervalo de tempo (Marco Zero de Leitura, 2014).
As transformações na vida dos alunos vão além dos números. Os mecanismos de monitoramento dão conta que os participantes reconhecem suas dificuldades e demonstraram motivação para enfrentar esse problema (ANTONIO, 2014). “Eu tinha uma dificuldade muito ruim com a Língua Portuguesa, mas aqui eu melhorei muito” (Carlos, 15 anos). “Eu gostei porque tenho muita dificuldade de leitura e escrita e morro de vontade de ler corretamente” (Isabela, 14 anos). É possível perceber que as experiências tecnológicas provoca o empoderamento dessas crianças. “Aprendi uma coisa que nunca vou esquecer: como contar uma história recortando o fundo de uma imagem e colocar outra” (Carlos).
Entre professores e gestão escolar as transformações criam condições de sustentabilidade do projeto. Em Goiás o programa de formação de professores foi apropriado como política pública, assim como muitos projetos desenvolvidos pelos professores passaram a integrar a política pedagógica de suas unidades.
Já no Tocantins a tecnologia vem contribuindo com a alfabetização em escolas rurais. A formação elevou e 12% para 38% o índice de atividades de leitura mediadas com novas tecnologias dentro da escola e ampliou a qualidade pedagógica de programas como Mais Educação e o Pacto pela alfabetização na idade certa.
Certificada pela FBB (2011), recebemos ainda principais prêmios nacionais de inovação em 2014: Prêmio ARede (categoria 3° setor); TelecentrosBR (categoria sustentabilidade social) e Prêmio Finep (Tecnologia Social). O projeto também inspirou pesquisadores, resultando na publicação de conteúdos acadêmicos como monografias, artigos e dissertações.
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