Problema Solucionado
No ano de 2000, a partir da realidade das comunidades da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil - IECLB na região do Vale do Taquari, onde lideranças relatavam problemas que causavam preocupações cada vez maiores (aumento de doenças e perda de auto estima), se percebeu a necessidade de desenvolver um trabalho na área de saúde preventiva com ênfase no resgate e valorização do auto cuidado com a saúde das famílias. A problemática percebida nas comunidades envolvia vários aspectos: a falta de auto cuidado com a saúde e o consequente surgimento de doenças; processo de industrialização da alimentação e a perda da cultura alimentar regional; uso indiscriminado de agrotóxicos e a consequente contaminação dos alimentos e meio ambiente; uso excessivo da medicina curativa e alopática em detrimento da fitoterapia e conhecimento popular sobre as plantas medicinais; desvalorização da cultura das famílias em ter hortas e pomares diversificados para auto consumo com perda de sazonalidade das colheitas, ficando refém de mercados convencionais.
Descrição
A concepção da ideia/tecnologia surgiu da necessidade apresentada pelas lideranças da IECLB em relação ao aumento de doenças e perda de auto estima nas comunidades na região do Vale do Taquari, no Rio Grande do Sul. Com base nesta demanda concreta foram realizados vários encontros entre lideranças da IECLB, lideranças comunitárias e equipe técnica do CAPA para construção de uma proposta de trabalho que contemplasse as necessidades das comunidades. Iniciou-se então em 2003 com oito grupos de saúde comunitária o que se denominou "Projeto de Saúde Comunitária".
A reunião inicial foi para apresentação institucional do CAPA, os eixos de atuação e equipe técnica responsável pelo desenvolvimento das atividades.
No segundo encontro foi realizado o diagnóstico dos principais problemas de saúde que acometiam a comunidade e planejamento participativo das reuniões e atividades a serem desenvolvidas e a definição das datas das reuniões (mensal ou bimensal).
A partir do planejamento elaborado no grupo a equipe técnica do capa (Nutricionista, Enfermeira e Agrônomo) organizou os materiais formativos e oficinas práticas a serem trabalhados com os grupos ao longo de cada ano.
1. Material formativo: se refere ao material didático com referências bibliográficas e estudos científicos, tendo em média de três a cinco páginas em tamanho A4. Citamos alguns exemplos de materiais:
1.1. Conhecendo e Identificando as plantas medicinais (material distribuído aos participantes contendo imagem da planta, nome científico, nomes populares, uso correto e seguro, forma de preparo e partes da planta utilizada, além de efeitos colaterais e contra indicações);
1.2. Prevenção de doenças através da alimentação saudável (material distribuído aos participantes sobre o valor nutricional dos alimentos, estudos de doenças que podem ser evitadas por meio de uma alimentação saudável, como por exemplo, hipertensão, diabetes, doença celíaca e intolerância a lactose);
1.3. Orientações e cuidados com a saúde após diagnóstico de doenças crônicas (material distribuído aos participantes contendo informações sobre o processo de adoecer, suas causas, sintomas e tratamentos, sendo que nosso foco é direcionado a importância da alimentação correta, da atividade física, da importância da água, do conhecimento das ervas medicinais, cultivo de hortas e pomares agroecológicos);
1.4. Segurança e soberania alimentar e nutricional (material distribuído aos participantes contendo orientações para a promoção da Agroecologia quanto ao manejo de hortas e pomares, prevenção e controle biológico pragas e doenças, o impacto e as consequências dos agrotóxicos e os transgênicos a saúde humana, animal e meio ambiente).
2. Oficinas práticas: são atividades práticas baseadas no material didático em que são elaboradas receitas e ou identificação de plantas e alimentos para uso e consumo familiar. Mencionamos alguns exemplos:
2.1. Resgate e valorização do saber popular sobre as plantas medicinais através de questionário sobre levantamento e identificação de plantas conhecidas, uso popular, forma de preparo e parte utilizada. Farmácia caseira com elaboração de pomadas, tinturas, xaropes, sabonetes e outros;
2.2. Inquérito alimentar para identificação dos hábitos alimentares do grupo. Elaboração de receitas sem glúten, integrais, hipossódicas, sem lactose, saudáveis entre outras;
2.3. Elaboração de caldas e insumos permitidos na produção ecológica (calda sulfocálcica, bordalesa, isca atrativa para mosca das frutas) poda e manejo de pomares, manejo de hortas (adubação verde, cobertura de canteiros com palhas, compostagem).
O processo de avaliação desta Tecnologia Social acontece anualmente, por meio de questionário com perguntas dirigidas, onde buscamos avaliar o andamento das atividades e os participantes também são provocados a sugerir ou aprofundar o estudo sobre algum assunto específico. Através destas avaliações são aperfeiçoados e incorporados novos temas e novas demandas a serem trabalhados nos grupos, baseado nos eixos de atuação do trabalho do CAPA. Além das reuniões mensais nos grupos acontece também uma vez ao ano um encontro de todos os grupos de saúde comunitária onde acontece uma palestra e também uma grande troca de experiencias entre os grupos.
O Projeto de Saúde Comunitária iniciou em 2003 com 8 grupos de mulheres. Em 2005 mais 8 grupos ingressaram no trabalho e 2006 havia demanda de mais 6 grupos de saúde comunitária. Já em 2008 novos grupos tinham interesse e 2015 mais 1 grupo inicia as suas atividades. Neste caminho alguns grupos pararam de se reunir por motivos diversos. Alguns por serem grupos reduzidos não conseguiram mais se reunir. Outros porque o trabalho formou lideranças capazes de continuar as atividades sem a nossa assessoria direta. Atualmente o trabalho desta tecnologia social é realizado em 16 grupos, sendo que destes 10 são do município de Teutônia, 4 no município de Westfália, 1 no município de Cruzeiro do Sul e 1 no município de Paverama.
Recursos Necessários
Se faz necessário para que a reunião aconteça: aquisição de livros, cartilhas, apostilas sobre os temas de saúde, alimentação e agroecologia; um computador para organização, preparação e digitalização do material didático; um equipamento para projeções (data show) um veículo para deslocamento até o local da reunião; Impressora, papel e tinta para impressão, material de expediente e internet.
Espaço físico para as reuniões com mesas e cadeiras e disponibilidade do uso da cozinha e seus utensílios domésticos (fogão a gás, forno elétrico, batedeira, liquidificador, louças e talheres entre outros);
Ingredientes para oficinas de farmácia caseira: plantas medicinais, vidros de xarope, vidros de tintura, potes de pomadas, vaselina sólida e álcool de cereais, cera de abelha, óleo de girassol, sabão neutro entre outros;
Ingredientes para oficinas de alimentação: farinhas orgânicas de milho, de trigo integral, de arroz, sementes como gergelim, chia, linhaça e amaranto, açúcar mascavo, melado, mel, cacau, aveia, ovos, leite, nata, manteiga entre outros.
Utensílios, ferramentas e ingredientes para oficinas de agroecologia: tesoura e serrote para poda, facão, enxada, pá, bota, pulverizador costal, preparo de caldas e biofertilizantes ( recipiente de 200 litros, sais minerais, leite, melado, esterco ), sementes de adubação verde, de hortaliças, de grãos, mudas de hortaliças, frutas nativas e plantas medicinais ).
Resultados Alcançados
O primeiro resultado observado já em 2005 foi a demanda de novos grupos solicitando a inclusão no projeto de saúde comunitária. Nos anos seguintes essa demanda se repetiu chegando ao total de 32 grupos, mostrando a replicabilidade da metodologia.
Desde 2003 foram realizadas avaliações anuais referentes as ações desenvolvidas com os grupos de saúde comunitária. Através destas, verificamos avanços e mudanças significativas quanto a melhoria da qualidade de vida por meio da alimentação saudável, do auto cuidado com a saúde, melhora da auto-estima das participantes e das famílias envolvidas.
Destacamos aqui também a redução do uso de medicamento alopático e auto-medicação.
Uso consciente e correto das plantas medicinais, assim como o cultivo de hortos medicinais, além da elaboração de diversos produtos da farmácia caseira por algumas participantes dos grupos que se tornaram referência nas suas comunidades.
Através de relatos é possível perceber melhoras na segurança e soberania alimentar e nutricional das famílias, por meio da revitalização e retomada das hortas domésticas, cuidados com os pomares e conscientização em relação a qualidade nutricional dos alimentos consumidos.
Outro resultado desta tecnologia foi a elaboração da cartilha "Receitas de Saberes e Sabores: Um Resgate dos Grupos de Saúde Comunitária" (material em anexo) onde é contada a história do saúde comunitária, trazendo o resgate de receitas antigas a base de ingredientes tradicionais/culturais e locais pelas participantes dos grupos.
Outro ponto de destaque do saúde comunitária foi a formalização de parcerias por meio de convênios entre o CAPA e 3 prefeituras municipais do Vale do Taquari em períodos distintos os quais apoiaram o saúde comunitária e acreditaram na importância deste trabalho de saúde preventiva e na agroecologia.
A participação de 2 grupos de Agentes Comunitários de Saúde nos municípios de Teutônia e Cruzeiro do Sul, contribui para o fortalecimento da Atenção Básica em Saúde e nas Politicas Públicas Municipais, uma vez que esses profissionais são multiplicadores do conhecimento adquirido e atuam diretamente nas comunidades.
A demanda e consequente inclusão de 2 grupos de mulheres beneficiárias do Centro de Referência de Assistência Social - CRAS ,do município de Westfália, aos grupos já existentes de saúde comunitária da Linha Schmidt e Linha Franck, demonstram novamente a eficácia e a atualidade do saúde comunitária também para o poder público municipal.
Comentários