Resumo
Maravalha segundo o dicionário da língua portuguesa é um substantivo feminino que significa pedacinho de madeira usado para atear ou acender fogo, graveto, garrancho, acendalha, apara ou lascas de madeira, que sozinhos quebram facilmente, mas que se reunidos se tornam difíceis de quebrar. Maravaia, pronúncia nordestina, tem o sentido do provérbio popular “a união faz a força”. Maravaia é a tecnologia social utilizada pela Fundação Tocaia para falar da estética metodológica de organização e fortalecimento de Redes de Coletivos de Educação - Cultura - Meio Ambiente - Saúde - Economia Solidária e Criativa - Direitos Humanos. Maravaia visa o protagonismo, a autonomia e o empoderamento social de jovens e mulheres em situação de vulnerabilidade social para a gestão compartilhada e a sustentabilidade do Território TransXingu. Construída por artistas e educadoras populares da Fundação Tocaia junto às comunidades de agricultores familiares, pescadores, ribeirinhos, extrativistas, indígenas e quilombolas durante os eventos educativos promovidos pela Fundação Tocaia, a Maravaia define a arte como principal instrumento para o diálogo, a informação e a formação e propõe traduzir linguagens técnicas e científicas em linguagens acessíveis. Materializando essa prática pedagógica com o Coletivo de Educadores, Artistas e Mulheres, dentre suas principais experiências, a Maravaia completa em 2019 seus 21 anos de existência. Alguns princípios adotados pela Maravaia demonstram o seu potencial de replicabilidade, dentre os principais podemos citar: a Roda, a Gestão Compartilhada, o Diálogo, a Valorização da Identidade/Diversidade, a Valorização dos saberes independente da escolaridade e da área de conhecimento, o Protagonismo, autonomia e o empoderamento social, e a Construção Contínua do Projeto Político Pedagógico. A iniciativa da Maravaia da Aprendizagem, que começa em caráter experimental em 1998 até 2008, contou inicialmente com a parceria do IBAMA, Fundação Carlos Gomes, Instituto de Artes do Pará, Prefeituras de Altamira, Brasil Novo, Uruará, Vitória do Xingu, Souzel, Anapu e Pacajá, Movimento de Mulheres da Transamazônica e Xingu, Coletivo de Música da TransXingu, Coletivo de Arte-educadores, Casa Familiar Rural, Universidade Estadual do Pará (UEPA), Universidade Federal do Pará (UFPA), Secretaria de Meio Ambiente e Turismo de Altamira(SEMAT), Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA), Diretoria de Educação Ambiental do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério da Cultura (MinC).
Problema Solucionado
Em sua fase piloto, que aconteceu de 2004 a 2008, a Maravaia identificou como problema a falta de grupos e coletivos organizados e articulados em Rede, a ausência de políticas públicas voltadas para esse público, a falta de recursos físicos, humanos, materiais e financeiros, o que ocasionou a insustentabilidade de diferentes grupos e coletivos. Por não haver incentivo por parte do governo, voltado para o fortalecimento dos artistas, educadores populares, profissionais da saúde, bem como para comunidades de agricultores e agricultoras, quilombolas, ribeirinhas, extrativistas no que se refere a sensibilização e formação continuada desses público é que se consolida vários coletivos temáticos articulados entre si para uma atuação que promova o fortalecimento em Rede de Coletivos como o de Música da TransXingu, o Coletivo de arte-educadores, o Coletivo Ói e Ôiça de Audiovisual a Cia PapoShow e a partir de 2014 o Coletivo de Mulheres do Xingu. A mobilização que demonstra o protagonismo das mulheres e dos jovens na realização dos seus encontros foi o primeiro resultado obtido com a estratégia de atuação em Rede. A sensibilização dos jovens do Coletivo de Música da TransXingu quanto a valorização da vida, da arte da educação como patrimônio histórico, natural e cultural e a formação continuada e em Rede articulada pelos mesmos demonstram a autonomia desse grupo na busca de alternativas que supram a ausência de políticas públicas na área da cultura. Por outro lado, a trajetória do Coletivo de Mulheres do Xingu na consolidação da sustentabilidade individual e coletiva tendo como foco a saúde integral, os direitos humanos e da mulher e a economia solidária e criativa são a base para o empoderamento e autonomia desses grupos que se encontra em situação de vulnerabilidade social.
Descrição
Começou-se a discutir com as lideranças e grupos a necessidade de priorizar a construção de uma Agenda de encontros de planejamento, monitoramento, acompanhamento e avaliação da intervenção sociocultural/socioambiental. O Coletivo de música é um desses exemplos quando realiza o Encontro de Bandas e Fanfarras (XII Edições) para sensibilização e formação continuada em música e educação ambiental envolvendo os oito municípios da TransXingu, tecendo esses momentos com mostras dos trabalhos desenvolvidos por cada localidade como culminância do processo. O evento mobilizou anualmente um público de aproximadamente 500 crianças e jovens representando o território TransXingu para intercâmbio e troca de experiências, bem como discutiu limites, potencialidades e propostas para a música e a educação ambiental. Assim também aconteceu com o Coletivo de arte-educadores, de audiovisual e a Cia PapoShow. Mais recentemente, o Coletivo de Mulheres do Xingu se apropria dessas estratégias para construir suas agendas de trabalho e intervenção. Nos diferentes espaços, conta-se com a participação da comunidade e governo. No caso do Coletivo de Música o trabalho de sensibilização começou pelas escolas, escolas de música, pontos de cultura, comunidades urbanas, rurais, ribeirinhas onde todo o público é articulado e mobilizado para discutir como vão resolver de forma coletiva diferentes situações. Esse processo ocorre com a participação das lideranças jovens, regentes, professores, diretores das escolas, pais, educadores, arte-educadores, cineclubistas e músic@s que representam o seu Coletivo Temático. Do mesmo modo acontece com o Coletivo de Mulheres e seus pares. A metodologia de trabalho conta com a Maravaia da Aprendizagem como estética metodológica que dentre seus princípios estão a Roda – opção estética, simbólica, ética, metodológica e política para os encontros celebrativos, de formação, de gestão e de proposição de gestão compartilhada nas políticas públicas; Diálogo - é escolhido para nivelar a importância de todos os atores sociais em sua identidade e saberes, dissolvendo o mito das hierarquias historicamente constituídas (autoridades políticas, acadêmicas, mercadológicas, religiosas, midiáticas, familiares); Valorização da Identidade – a identidade de cada pessoa e grupo é constituída pelo que a distingue dos demais, é o seu DNA cultural, necessário e constituinte da teia da vida. Através da memória e das manifestações culturais, são reforçados os aspectos identitários essenciais à garantia da dignidade humana, grupal e de toda a sociedade; Valorização dos saberes - independente da escolaridade e da área de conhecimento, valorizar todos os saberes não oficializados/reconhecidos pela ciência, os saberes construídos nas ruas, nos campos, nos grupos, nas etnias, nas experimentações, nas anarquias; Valorização da partilha – a ideia de partilhar é mais ampla do que trocar, é o paradoxo racional de “doar-se e com isso ampliar o que se tem, o que se é”; Protagonismo, autonomia e empoderamento social – o estímulo à auto-estima pessoal e coletiva através do protagonismo em busca de uma autonomia política, estética e econômica dos processos culturais e educativos; Gestão Compartilhada do Bem Comum – como exercício da democracia radical, a proposta é o compartilhamento do bem comum (natural, cultural) e do poder, a partir da participação de absolutamente todos e todas nas decisões que afetarão os destinos comuns; Concepção de comunidade além do conceito territorial valorização das periferias sociais, urbana, rural e ribeirinha com estímulo a criação e fortalecimento de comunidades temáticas que surgem em torno da música, da educação ambiental, do software livre, dos pontos de cultura, rompendo os limites das fronteiras geográficas; Visão de mundo integradora – concebe o mundo como um todo integrado, e não como uma coleção de partes dissociadas; Valorização do mágico e do lúdico presentes na arte, esporte, lazer, espiritualidade e nas brincadeiras – encurtando as distâncias entre matéria e transcendência e evocando a inteligência multifocal do homem integral.
Recursos Necessários
A ação demanda recursos financeiros para garantir uma equipe facilitadora e a mobilidade da mesma entre os grupos e nos municípios onde ocorre o desenvolvimento do processo deflagrado pela Maravaia. Bem como recursos físicos (espaços de formação, salão de eventos) e materiais (didático, expediente, comunicação/divulgação), financeiros para suprir as despesas de transporte e alimentação do público e para realização das ações.
Em relação a infraestrutura, faz-se necessário para algumas localidades transporte terrestre para o trabalho de articulação e mobilização das comunidades no Território; Locação ou aquisição de espaço amplo para reuniões com aproximadamente 50 pessoas para o planejamento e formação continuada dos grupos representantes regionais; Mesas, cadeiras, computadores, notebooks, datashow, filmadora, máquina fotográfica, microfones sem fio, microfones auricular, cabos para os instrumentos e equipamentos, caixas de som, telão 4X4 m, violões de nylon e aço, baixo acústico, conga, bongô, garron, armários e prateleiras de madeira; central de ar 10.000 btu's, freezer, fogão, geladeira, liquidificador, cafeteira, barracas para acampamento, colchonetes.
Resultados Alcançados
Fortalecimento das 8 escolas de música, 10 cineclubes, mais de 900 artistas e músicos através do protagonismo dos grupos na realização de iniciativas como esta; Formação de um Coletivo Regional de Música e Educação Ambiental Popular representando as crianças e jovens dos municípios participantes, bem como, ampliação do número de cineclubes em Altamira e região; Gestão compartilhada da música, do audiovisual e da Educação Ambiental Popular com a autonomia dos participantes na tomada de decisão, nas negociações com o poder público, na qualificação e valorização do músico do artista como profissional; Mais de 1 milhão de reais em recursos captados através de editais de projetos e prêmios, bem como o apoio do governo local e empresas na realização dos eventos; O destino da música, do audiovisual e da educação ambiental popular conduzidos pelos participantes e comunidade demonstrando o empoderamento social do Território. Ainda assim, consideramos que o trabalho de sensibilização e fortalecimento dessas Redes está em processo de amadurecimento. Muito ainda se tem para conquistar/alcançar, considerando-se que essa inciativa necessita de tempo, recursos e pessoal que possam dedicar mais atenção a esses grupos que demandam informação, formação, orientação, acompanhamento, apoio. O intercâmbio se torna uma estratégia fundamental nesse processo como garantia de manutenção dos laços de amizade, parceria, compartilhamento de responsabilidades. Um dos principais ensinamentos tem sido exercitar a compreensão em relação ao tempo de aprendizado de cada pessoa, grupo, instituição, coletivo. Saber enxergar os aspectos positivos dessas experiências sem esperar somente resultados quantitativos. A formação de grupos, companhias, coletivos temáticos, a exemplo da Cia PapoShow, do Coletivo de Música, do Coletivo Ói e Ôiça de Audiovisual que foram replicando os princípios da Maravaia como estratégia de sensibilização e formação continuada em cultura e educação ambiental e popular, além da organização para a gestão compartilhada e qualificação desse público em suas especificidades, foi um dos maiores resultados que puderam demonstrar a sua emancipação, o caráter replicável da tecnologia Maravaia, quando os mesmos passaram a demonstrar a sua relação de pertença, de se identificar com as coisas do lugar, e com isso assumirem o seu papel de cidadão, bem como o empoderamento dos grupos que se sentiram motivados e se tornaram protagonistas com potência de ação.
Do mesmo modo, apresentamos como resultado o Coletivo de Mulheres do Xingu na gestão do projeto “Mulheres da Terra, Águas, Florestas Sustentáveis” que se desdobrou em mais 2 projetos, a “Feira Mulher de Economia Solidária e Criativa” e “Cuidado e auto-cuidado: saúde Integral e Sustentabilidade”. São projetos que tratam de denunciar e combater todas as formas de violência contra mulheres e meninas através de reuniões, encontros para organização e planejamento local e regional ao longo de 7 municípios da Transamazônica e Xingu, manifestações, audiências públicas, intercâmbios locais, regionais e nacionais. A formação em educação ambiental para a sustentabilidade é adotada tendo a arte como linguagem de facilitação do acesso as informações e compreensão dos temas. Dessas iniciativas, surge a necessidade de pensar e buscar formas de economia como estratégia de autonomia e empoderamento. Simultaneamente, as mulheres sentem também necessidade de falar sobre a saúde e como enfrentam o dia-a-dia para garantir esse direito. Como resultado, consolida-se a proposta do cuidado e auto-cuidado entre ativistas através da Medicina Integrativa.
Lideranças feministas importantes desse território compõem não apenas a equipe do projeto como também o quadro de associadas do Coletivo de Mulheres do Xingu e organizações parceiras. São as mulheres que fundaram o movimento no sudoeste paraense e lideram a luta pelos direitos humanos, da mulher, da criança e adolescente e do meio ambiente. Dentre as conquistas podemos destacar a Criação e Funcionamento da Delegacia Especializada da Mulher em Altamira; Acesso ao Poder Judiciário (diálogo e ações conjuntas); Trabalho de Base com as mulheres (urbanas e ribeirinhas) deslocadas compulsoriamente no contexto da construção da hidrelétrica de Belo Monte no Rio Xingu; Criação da Comissão Maria da Penha Xingu na cidade de Altamira; Construção integrada das organizações de mulheres em torno do 08 de março; Participação no Tribunal de Justiça e Defesa dos Direitos das Mulheres Panamazônicas e Andinas, que ocorreu no VIII Fórum Social Panamazônico “para punir e erradicar a violência contra as mulheres”; Agenda feminista de luta contra a violência contra a mulher em suas territorialidades. Bem como, formações e articulações de combate à violência com entidades feministas e sociedade local.
Alcançou-se uma melhor compreensão por parte das 900 mulheres beneficiadas acerca dos seus direitos e como saber se colocar diante da família e sociedade. Aprofundou-se o sentimento de amizade, respeito e solidariedade entre este público, a segunda maior resposta esperada, e, por último, manteve-se a inquietação e potencializou-se e amplificou-se as ações das mulheres à nível de Brasil e América Latina, algo materializado nesta proposta.
Tomadas de informações, conhecimentos, estímulos ao cuidado e auto-cuidado e a sua autonomia financeira e de pensamentos e ações, as beneficiárias se sentindo encorajadas a mudanças de atitudes, comportamentos e práticas. Sentindo-se empoderadas para se prevenir e incentivar suas filhas, netas, amigas, irmãs, primas à prevenção e eliminação da violência contra mulheres e meninas.
A partir das ações implementadas pelo Coletivo de Mulheres do Xingu ao longo de 7 anos, práticas, atitudes e comportamentos individuais tornando-se coletivos, comunitários, institucionais, amplificados e potencializados na Amazônia e demais regiões do Brasil no combate e eliminação de toda forma de violência contra mulheres e meninas.
Como resultado, o fortalecimento da rede de coletivos de mulheres, envolvendo também as beneficiárias secundárias, como motivação a novas estratégias e abordagens na luta em defesa, conquista e garantia dos seus direitos de mulher, e como catalizador de ações de economia criativa e saúde integral aliada a comunicação segura e independente.
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