Objetivo
O plantio da Mandala Tintorial como fonte de insumos para alimentação e artesanato Guarani busca fortalecer a autonomia de povos originários M’bya visando alcançar a autossustentabilidade, sendo uma tecnologia fundamentada em razões existenciais, voltadas à permanência e valorização da cultura, à segurança alimentar, à preservação ambiental, à saúde e à geração de renda das comunidades.
Problema Solucionado
Nas 12 tekoas (aldeias) Guarani M’bya do norte de SC, mais de 680 indígenas (levantamento quantitativo de Iris Bessa, 2020) enfrentam questões de segurança alimentar, saúde, renda, disputa territorial, discriminação e preservação cultural.
Em 2021, identificamos que, ainda que o artesanato Guarani seja uma fonte de renda essencial para a sobrevivência, sair da aldeia para obter matérias-primas e vender peças é uma condição de exposição e perigo.
Ademais, a maior parte é produzida por mulheres, também responsáveis pelo cuidado principal com as crianças. As miçangas de plástico e as tintas industriais são um risco à saúde infantil, afastando a presença dos filhos na produção, e tornando a venda ainda mais arriscada, já que as crianças saem das aldeias às cidades com as mães.
A tecnologia da Mandala Tintorial foi desenvolvida junto à médica Pollyanna Moreira, agente pública da SESAI e responsável pelo cuidado do povo M’bya da região, e a agricultores da Reforma Agrária (assentamento Justino Draszevski), visando produzir alimentos, matérias-primas naturais, saúde, emprego e renda para as aldeias, apoiando a distribuição do artesanato e a regeneração de ecossistemas pela agroecologia.
Descrição
Para o Instituto Muhda, o cuidado ancestral com a terra e a inovação tecnológica não são dimensões opostas, mas complementares na luta pela justiça socioambiental. Por isso, a estratégia de implantação da Tecnologia Social da Mandala Tintorial equilibra saberes milenares de plantio com técnicas da agroecologia para eficientizar o acesso ao alimento e a matérias-primas, favorecendo a saúde e a geração de renda do povo originário Guarani M’bya.
Cumpre-nos dizer que esta tecnologia vem sendo desenvolvida há 2 anos, com projetos em diferentes estágios em comunidades catarinenses.
Ao conceber o plantio de espécies tintoriais como jenipapo, urucum, erva-mate, soja e açaí, esta Tecnologia Social preserva a dimensão da saúde, substituindo produtos industriais pela transformação da matéria-prima vegetativa local. Um bom exemplo é a folha de penicilina – cuja extração para aplicação medicinal é chamada “tintura medicinal de penicilina” –, que está sendo introduzida na Mandala Tintorial da aldeia Morro Alto, com mais de 120 indígenas residentes (imagens disponíveis no item 9. “Anexos e Links”).
Em geral, as fases de implementação da tecnologia são as seguintes:
Fase 1 – Planejamento
1. Escuta: a cada novo plantio, o Muhda parte das necessidades específicas do território, elencadas pelos habitantes das comunidades.
Exemplos: preferências e hábitos alimentares da população; sementes utilizadas no artesanato e condições de acesso/obtenção das matérias-primas; familiaridade da população artesã quanto ao uso do tingimento natural; reconhecimento do bioma nativo e das condições climáticas, hídricas e de solo da região.
2. Desenho da Mandala: o Instituto Muhda propõe, para apreciação da comunidade, o projeto conceitual da mandala, considerando a disposição das espécies em plantio consorciado, orientadas pelo equilíbrio entre as de grande/pequeno porte e as de adubação verde, que regeneram o solo e oferecem potencial tintorial, com aspectos estéticos que remetam às expressões artísticas da comunidade (imagens disponíveis no item 9. “Anexos e Links”).
Fase 2 – Implementação
Entendendo que a defesa do valor da vida manifesta deve ser realizado em comunidade, com inclusão e pertencimento, todas as etapas de Implementação são realizadas em mutirões coletivos, com apoio da equipe técnica do Instituto Muhda. As atividades são:
1. Regeneração do solo: a garantia de um solo fértil e produtivo envolve a correção do pH com calcário, pó de rocha e composto orgânico.
2. Preparação de Canteiros: etapa de delimitação dos berços de mudas e sementes e da identificação visual das espécies.
3. Mutirão de Plantio: os eventos de plantio respeitam as diferentes sazonalidades adequadas para introduzir cada uma das espécies, momento reservado também para aprofundamento dos usos e características de cada planta.
Fase 3 – Processos pedagógico-formativos
1. Oficinas de Cultivo Agroecológico: apostila disponível no item 9. “Anexos e Links”.
2. Oficinas de Tingimento Natural: apostila disponível no item 9. “Anexos e Links”.
3. Oficinas conduzidas pela própria comunidade: as definições de forma e conteúdo ficam a cargo das lideranças mulheres locais. No caso da Mandala do Flor de Hibisco (Araquari/SC), foram realizadas oficinas de medicinais e PANCs com representantes de 4 aldeias M’bya da região (tekoas Tarumã BR, Tarumã Mirim, Yvapuru e Pindoty).
Fase 4 – Acompanhamento
1. Manejo Agroecológico: esta é uma etapa executada regularmente pela própria comunidade. O manejo orgânico é um compromisso acordado entre o Instituto Muhda e os agentes locais de cuidado com a terra. Para garantir este acordo, o Instituto Muhda oferece a capacitação através das oficinas de cultivo agroecológico já descritas na fase anterior.
2. Monitoramento do Desenvolvimento: o Instituto Muhda faz um acompanhamento periódico para observar o crescimento das plantas, sua adaptação ao ambiente e verificar sinais de deficiências nutricionais ou outras doenças.
Fase 5 – Avaliação
1. Avaliação de Resultados: o impacto é mensurado anualmente a partir dos critérios: a) Produtividade (kgs de alimentos colhidos); b) Biodiversidade (quantificação e catalogação de novas espécies nativas introduzidas e já adaptadas ao ambiente); c) Geração de renda do artesanato (cálculo da redução de custos com matéria-prima e % de crescimento das vendas de peças); d) Número de pessoas atendidas pelas plantas medicinais cultivadas na Mandala.
Recursos Necessários
Os recursos necessários variam conforme a localização das comunidades e a área de implantação da Mandala. Para uma mandala de até 120 m², elencamos os seguintes itens:
Pessoal:
- Produção Local;
- Equipe Técnica de Agronomia (Plantio);
- Equipe Técnica de Artes (Tinturaria Natural);
- Consultoria de Acessibilidade;
- Alimentação nos mutirões de plantio e oficinas;
- Transporte (gasolina).
Materiais:
- Blocos para construção;
- Mudas e sementes alimentícias (banana, abóbora, batata, repolho, açaí etc.);
- Mudas e sementes tintoriais (urucum, jenipapo, anileira, erva-mate etc.);
- Sistema de irrigação;
- Materiais gráficos (identificação visual das espécies e apostilas).
Equipamentos:
- Perfurador de solo;
- Roçadeira;
- Ferramentas para os mutirões (enxada, facão, foice etc.);
- EPIs.
Resultados Alcançados
Desde a primeira mandala implantada, realizamos visitas presenciais periódicas para avaliar:
1) Mandala Tintorial no Espaço Flor de Hibisco (implantada em 11/10/21):
O Flor de Hibisco é um espaço do assentamento Justino Draszevski em que confluem agricultores familiares, indígenas Guarani M’bya e quilombolas (quilombo Itapocu). Nesta Mandala, estimamos 200 pessoas beneficiadas diretamente, uma vez que o excedente da produção é doado às aldeias M’bya vizinhas (Tarumã BR, Tarumã Mirim, Yvapuru e Pindoty). O Flor de Hibisco oferece atividades de turismo rural, recebendo cerca de 50 visitantes por mês (600 pessoas indiretamente impactadas por ano).
A área aproximada da Mandala é de 113,04 m², com cerca de 50 espécies.
Após a implantação da tecnologia, recebemos o financiamento do Fundo Casa Socioambiental para a melhoria do SAF em que a Mandala está inserida (R$ 40 mil).
O acompanhamento é realizado mensalmente.
2) Mandala Tintorial na tekoa (aldeia) Tarumã Mirim (implantada em 25/06/22):
Na tekoa Tarumã Mirim, vivem cerca de 50 indígenas Guarani M’bya. O mutirão de plantio da Mandala envolveu cerca de 40 participantes, e a programação do evento envolveu rodas de conversa sobre plantas medicinais e sobre preparo do solo para plantio na Ara Pyau (Primavera Guarani), oficina de xarope medicinal, oficina de pintura com tintas naturais e oficina de comunicação de arte.
A área aproximada da Mandala é de 78,5 m², com cerca de 20 espécies.
Após a implantação da tecnologia, recebemos o Prêmio Elisabete Anderle 2022 para financiamento de oficinas de tingimento natural com as plantas que integram a Mandala (R$ 30 mil).
O acompanhamento é realizado sob demanda.
3) Mandala Tintorial na tekoa (aldeia) Morro Alto (em implantação desde 18/08/23):
Na tekoa Morro Alto, vivem cerca de 130 indígenas Guarani M’bya. A Mandala Tintorial está em fase de Planejamento, junto a outras iniciativas em curso que envolvem a produção de tintas naturais, saúde oftalmológica e preservação da cultura Guarani.
Em 2023, recebemos o financiamento da concessionária Águas de São Francisco para os projetos realizados na aldeia, beneficiando a população artesã de maneira transversal, com oficinas de tingimento natural e uma ação de saúde dos olhos para acuidade visual das artesãs e artesãos da aldeia (R$ 65 mil).
Depoimentos dos participantes podem ser acessados no link do item 9. “Arquivos e Links”.
Público atendido
Agricultores familiares
Povos indigenas
Povos tradicionais
Mulheres
Crianças
Tecnologias Sociais Semelhantes
Adolescentes Protagonistas
Saneamento Básico Na Área Rural - Fossa Séptica Biodigestora
Secador Solar De Madeira
Resgatando Gerações: Medidas Socioeducativas Aos Adolescentes Infratores