Objetivo
Melhorar a eficiência e o conforto da atividade de quebra do coco babaçu por meio do uso de ferramenta individual, com acionamento manual, adequada à realidade das mulheres quebradeiras de coco das comunidades extrativistas do babaçu, levando em conta a ergonomia, o rendimento do trabalho, o aproveitamento integral dos componentes do fruto, a agregação de valor e a melhoria da renda das famílias.
Problema Solucionado
O sistema extrativo de coleta, transporte e quebra manual do coco babaçu apresenta muitos inconvenientes, como a penosidade do trabalho, a pouca produtividade e a baixa remuneração. Por isso, essa atividade vem sendo menos atrativa no meio rural, principalmente aos jovens, e tem sido abandonada pelas famílias, reduzindo também a oferta de sementes no mercado. A quebra manual do coco é um fator limitante à produção, porém a quebra com grandes máquinas implica em despesas com energia elétrica, manutenção etc. A Embrapa Cocais realizou, em 2010, um estudo de avaliação de diversas máquinas disponíveis no mercado que pudessem atender às necessidades das quebradeiras de coco. Porém, por terem sido idealizadas para a quebra de grandes quantidades de coco, não se tornam compatíveis com as dinâmicas de safras, operações de colheita extrativa e antigas tradições das famílias. Sendo assim, tornou-se necessário desenvolver um equipamento eficiente para a quebra do coco e extração das sementes, com aproveitamento integral dos componentes, visando agregar valor à produção familiar e melhorar a renda das famílias, mas em escala adequada para utilização nas comunidades tradicionais de quebradeiras.
Descrição
Essa ferramenta é fruto da construção de conhecimento de forma participativa, em que a pesquisa e o desenvolvimento envolveram o seu público-alvo desde a concepção, ajustes e validação, até a finalização da tecnologia. A ferramenta individual para quebra de coco babaçu foi sonhada durante anos pelas quebradeiras de coco. Inicialmente, por meio de consultas a grupos organizados de quebradeiras, foram definidas quais seriam as características ideais para uma tecnologia que atendesse às suas demandas: deveria ser uma ferramenta de uso individual, que funcionasse através de sistema de acionamento mecânico (sem necessidade de energia elétrica) e de baixo custo (de modo a ser acessível).
Em uma segunda etapa, a equipe técnica da Embrapa realizou uma pesquisa visando identificar alguns princípios mecânicos capazes de acionar uma lâmina de corte para cisão do coco, de modo que a operação fosse semelhante ao usado no método tradicional. Esse levantamento identificou algumas experiências que não foram implementadas ou aceitas pelas quebradeiras de coco babaçu, pois não atendiam a algumas exigências como, por exemplo, a separação das sementes (“amêndoas”) do endocarpo (parte lenhosa do fruto).
Dentre os princípios identificados, um mecanismo utilizado no sistema de caixas de direção veicular de pinhão e cremalheira foi definido como uma opção promissora para multiplicar a força humana na alavanca. O mecanismo foi adaptado para compor a ferramenta de quebrar o coco. A ferramenta é composta por uma alavanca que gira e aciona o eixo que é instalada uma lâmina de aço (com tratamento térmico). A lâmina é rosqueada ao eixo de acionamento e é capaz de cortar o coco tanto no sentido longitudinal como transversal.
Cada ferramenta segue com uma lâmina acoplada e uma lâmina extra para permitir substituição, de modo que as lâminas possam ser afiadas sem interrupção do trabalho. A vantagem da ferramenta desenvolvida é que tem o princípio usado para a extração das sementes (“amêndoas”), utilizado tradicionalmente pelas quebradeiras de coco, ou seja, uso da força de um porrete de madeira para pressionar uma lâmina (do machado) a entrar no coco e permitir a extração da semente. Esse detalhe tem ajudado no processo de adoção da ferramenta como opção de melhoria das condições de trabalho e rendimento financeiro familiar. A habilidade adquirida no método tradicional de quebra do coco pode ser intuitivamente utilizada no uso da nova ferramenta.
O mecanismo de corte foi então instalado em uma estação de trabalho, toda em metal resistente, onde há uma cadeira confortável, com regulagem de posição. Dessa forma, as mulheres quebradeiras de coco trabalham sentadas de maneira ergonômica, com apoio nas costas e em posição adequada.
Definidos o modelo do protótipo inicial, foram realizados testes de operação e aferição de rendimento em ambiente de laboratório. Nessa etapa, foram realizados pequenos ajustes e aperfeiçoamentos necessários para melhorar a eficiência do corte e diminuir a força humana necessária para o corte da semente.
Cinco protótipos foram construídos com a validação das quebradeiras de coco das comunidades tradicionais que avaliaram o rendimento da ferramenta. Foram estudadas as informações de produção de cocos quebrados por dia em ambiente operacional (nas comunidades tradicionais). Foram realizados testes e validação da ferramenta com grupos organizados de quebradeiras de coco nos municípios maranhenses de Itapecuru Mirim, Caxias, Cajari, Anajatuba, Pindaré Mirim, Alto Alegre do Pindaré e Lago do Junco. Foram obtidas percepções e sugestões das quebradeiras de coco para melhoria da ferramenta em desenvolvimento.
A partir das sugestões feitas, uma nova versão do protótipo foi construída, corrigindo e adequando pequenos detalhes às condições de trabalho vivenciadas pelas quebradeiras. As pernas e a coluna vertebral ficam bem apoiadas proporcionando maior conforto ergonômico. Nos testes de validação realizados, houve grande aceitação da ferramenta pelas mulheres quebradeiras de coco babaçu, em virtude da melhoria nas condições de trabalho proporcionadas.
Algumas mulheres quebradeiras declararam que já não conseguiam mais trabalhar com o machado devido às condições de saúde. Entretanto, ao fazer o uso da nova ferramenta declararam que, com essa tecnologia, voltariam à atividade de quebra do coco.
De uso muito fácil, a ferramenta demanda pouco tempo de aprendizado. As mulheres se familiarizam rapidamente com o funcionamento, já que toda a habilidade do processo tradicional pode ser utilizada na estação de trabalho criada.
Recursos Necessários
A ferramenta é constituída de uma estação de trabalho para uma pessoa sentar-se e operar, feita em estrutura metálica, com solda e parafusos, contendo com um mecanismo multiplicador da força humana e uma lâmina de corte, além de uma cadeira. A estrutura é construída com perfil metálico de 20 mm x 30 mm, com 1,6 mm de espessura. A cadeira foi instalada de forma a ajustar a distância até o mecanismo de corte. O peso da pessoa trava a cadeira na posição. O mecanismo multiplicador é instalado sobre uma base de chapa metálica de forma que o eixo se mova na posição vertical. O eixo acoplado à parte inferior do multiplicador é de aço e tem a extremidade rosqueada para receber a lâmina. A lâmina é de aço com tratamento térmico e pode ser afiada. Uma alavanca de 4 braços é acoplada ao multiplicador para acionamento, permitindo o giro em dois sentidos. No sentido horário, o eixo da lâmina desce e, no sentido anti-horário, sobe. A relação das engrenagens do multiplicador é de 1:6, ou seja, cada quilo de força humana aplicada na alavanca de acionamento resulta em 6 kg de força no eixo da lâmina. Durante o processo de desenvolvimento da ferramenta foi utilizado um sistema de cremalheira e engrenagem de caixa de direção veicular para os testes. Entretanto, foi projetado um sistema multiplicador especial para melhor efeito na multiplicação da força que a pessoa faz ao acionar a alavanca. Para tal, as engrenagens foram usinadas e a caixa e os outros componentes foram fundidos.
Resultados Alcançados
Estudos recentes sobre a saúde das mulheres quebradeiras de coco mostram que 84% reclamaram de dores na coluna, 40,90% de dores nos ombros e 77,40% de dor lombar devido ao trabalho da quebra do coco (Vale, 2015)*. Várias mulheres declararam que foram obrigadas a deixar a atividade por causa das sequelas de passar mais de seis horas por dia sentadas no chão, com as pernas dobradas apoiando o cabo do machado para quebra do coco.
Durante o desenvolvimento da ferramenta, um primeiro protótipo de estação de trabalho foi colocado, durante dois anos, em operação na Cooperativa Babaçu é Vida, em Itapecuru Mirim, para ser testado pelas quebradeiras de coco. Várias quebradeiras de coco opinaram sobre o funcionamento da ferramenta após um período de uso e adaptação. No princípio, elas mostraram desconfiança e acharam que não tinham força para acionar o mecanismo. Entretanto, depois de pouco tempo de uso, e com suas habilidades peculiares, as mulheres perceberam que a operação da ferramenta não necessita de força excessiva, já que possui o mecanismo multiplicador da força humana. Dessa maneira, usam toda a experiência anterior em manusear o coco para extrair as amêndoas com a nova ferramenta.
O teste de validação consistiu em comparar os rendimentos da quebra do coco com o machado e da quebra do coco com a ferramenta. Para poder aferir o rendimento com a ferramenta, adotou-se um período de adaptação de pelo menos um dia de trabalho. Nos momentos iniciais de uso, a produtividade com o uso da ferramenta foi 30% menor do que com o uso do machado. Entretanto, esse desempenho tem sido melhorado com a adaptação das quebradeiras ao uso da máquina. Apesar da diminuição inicial da produtividade/rendimento, o conforto foi uma sensação unânime entre as quebradeiras que já experimentaram a nova estação de trabalho, pois proporcionou melhoria da postura e da ergonomia geral da pessoa que opera. Certamente, com o tempo de uso, a eficiência aumentará. Até o momento, um dos maiores benefícios dessa tecnologia social é a melhoria das condições de trabalho das quebradeiras de coco. Inspira mais respeito e dignidade, o que pode, ainda, proporcionar a volta de muitas mulheres à atividade de extrativismo do babaçu.
* VALE, S. R. G. A. Avaliação do perfil das quebradeiras de coco babaçu e de suas condições de trabalho no município de Itapecuru-Mirim/MA. Rio de Janeiro, 2015. 111 f. : Il. (Dissertação - Mestrado Interinstitucional em Saúde Pública e Meio Ambiente – Fundação Oswaldo Cruz).
Público atendido
Agricultores Familiares
Assentados Rurais
Mulheres
Povos Tradicionais
Outros
Comentários